“Eu não quero mais viver! A vida perdeu o tom, a graça, o gosto e a luz!” – costuma-se ouvir daquele que se permitiu deslustrar e que não deseja mais viver. Dolorido, o discurso revela uma desordem nas ideias, um desconforto pelo fato de viver e de existir, um misto de desesperança com desespero, uma aspiração frustrada ou um amargo transtorno. Torna-se fundamental dizer que o sujeito que deseja cometer o “suicídio pode não ser necessariamente” alguém marcado “de covardia ou de coragem”, mas que, sim, está na divisa dos “seus sofrimentos”. A paciência “se esgota, a incredulidade prevalece” (Botelho: 2011). Alguns cometem o suicídio por não identificarem alternativas possíveis para a solução dos seus desafios, seja por estarem “em estado de desrazão” (Botelho: 2011), seja por preencherem a mente por um profundo desespero, o que os leva à incredulidade mórbida ou excessiva.
São várias as causas que levam ao suicídio. Por isso, é difícil explicar por que algumas pessoas escolhem o suicídio, enquanto outras, em situação similar ou pior, não o fazem (Santos: 2008). Entretanto, uma parte dos suicídios pode ser prevenida, conforme consta no Manual de Prevenção do Suicídio para Profissionais de Saúde, elaborado pela Organização Mundial da Saúde – OMS (2000). A prevenção envolve, sobretudo, “atenção aos comportamentos, disponibilizando formas de contato, como número de telefone, consultório, formas de acolhimento, demonstração de interesse e respeito” (Santos: 2008).
Embora muitos de nós já tenhamos expressado o desejo de “sumir do mapa”, somente uma minoria chega a cometer o ato letal. Para chegar ao ato suicida, muitas características devem ser observadas, desde transtornos de afetividade, [des]estrutura familiar, doenças crônicas, meio religioso, contexto sociocultural, componentes genéticos, etc. Mas, Cassorla (1998) explicita que o suicídio é um “evento que ocorre a partir do acúmulo de acontecimentos na história de vida da pessoa”, que vai se misturando aos aspectos físicos, genéticos, sociais, espirituais, etc. Botelho (2011) afirma que “alguns cometem [o suicídio] por terem mergulhado na loucura, outros por martírio (no ato de fé como no caso dos religiosos)”. No mesmo sentido, Pires (2004) diz que desde todos os tempos essas ideias martíricas de desenvolvem no seio ambivalente das religiões, onde os “amantes da morte” se nutrem de “desesperos e angústias, sacrifícios, autoflagelações, cilícios, conformismo piedoso, torturando-se para as delícias do paraíso”.
Por outro lado, sabe-se que existem diversas mortes simbólicas na vida de cada sujeito. Por ilustração: a passagem da infância para a adolescência marca a perda do corpo infantil e a perda dos pais da infância, o que levará o indivíduo a atravessar uma morte simbólica. Quando a pessoa chega ao suicídio de fato, já ocorreram mortes significativas, o que não significa quantidade de mortes simbólicas, mas, sim, um montante de mortes parciais (ou simbólicas) suficiente para diluir as potencialidades, consumando o sujeito, anuviado, em uma espécie de gradativa dilaceração. O ato letal somente constitui um ápice para esse amargo, doloroso e aflitivo processo.
Existem ficções e fatos a serem observados para a prevenção eficiente do suicídio. De acordo com o quadro disponibilizado pela OMS (2000), a ideia de que “pessoas que anunciam o suicídio” não o cometem é notoriamente falsa. É sabido que a maioria das pessoas que deram o fim à própria vida realizou anúncios ou avisos a amigos ou parentes. Além disso, a cartilha informa que nem todos os suicídios podem ser prevenidos, embora a ação preventiva deva ser constantemente realizada por profissionais da área de saúde e educação.
Na família, o enfrentamento do suicídio é doloroso e deixa profundas marcas na vida de todos os parentes. A elaboração do luto e da perda pode se agravar pelo sentimento de culpa excessiva, acusações desmedidas contra parentes que moram em cidades distantes e pelas mágoas que voltaram a emergir mesmo após anos depois de transcorrida a contrariedade familiar. Botelho (2011) afirma que o melhor a se fazer é “parar de buscar culpados ou de se culpar”. Assim, o olhar dos envolvidos deve se dilatar para todos os que estão gravitando em torno do trágico evento, de forma de que se perceba que eles estão fazendo “o melhor que eles conseguem, diante das circunstâncias difíceis que se apresentam” (Botelho: 2011).
Os que sobreviveram devem se socorrer mutuamente com dedicação, sinceridade e carinho, bem como manter acesa a chama do diálogo. É essencial perceber que a vida prossegue, assim como buscar apoio nas redes de relacionamento, nas atividades transcendentes (atividades religiosas, sociais, culturais) e com profissionais especializados. Mas, em meio ao caos, não é prudente manter as aparências da força e da coragem, uma vez que essas estruturas foram abaladas com a morte imprevista. É importante extravasar as emoções. Por isso, não insista em ficar de pé. Sente-se e reaja de acordo com os traços da sua personalidade. Sentimentos como a culpa, a raiva, a frustração e a vergonha podem emergir. O importante é não inibi-los completamente, mas, sim, comunicá-los, favorecendo a elaboração do luto. É fundamental o compartilhamento de ideias e de emoções, assim como o uso de todos os rituais (de acordo com as crenças da família) para se iniciar o processo de elaboração. Por fim, o cuidado dispensado deve primar pela reorganização de papéis na família, a fim de que os envolvidos possam identificar, mais unidos e fortalecidos, os dias melhores que virão.
Fonte: http://www.quandoavidadizadeus.com/2011/09/o-impacto-do-suicidio-e-as-medidas-de.html#ixzz1ZRseUaM2
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