quarta-feira, 23 de março de 2022

Suicídio: o que precisamos saber para evitá-lo? 

Sempre que um caso de suicídio é divulgado na mídia, o tema ganha repercussão nas redes sociais, na imprensa e nas rodas de conversa. Todo mundo tem algo a dizer sobre um assunto que, se é verdade que gera diferentes opiniões, choca toda a sociedade por ir contra um dos instintos mais básicos dos seres humanos: o da preservação da vida. 

Mas é preciso cuidado ao tratá-lo, e não é possível abordá-lo sem algumas premissas, sob o risco de ser leviano e preconceituoso.

1. Suicídio é um problema de saúde pública

Ao contrário do que diz o senso comum, o suicídio não é um problema individual, mas de saúde pública. Isso significa que em termos de natureza, extensão, severidade, significância e potencial de expansão, o suicídio causa um grande impacto na sociedade e, portanto, deve ser priorizado por meio de ações e políticas públicas.

2. É um fenômeno multicausal

O suicídio não tem uma causa única, é um fenômeno multifatorial, e, portanto, difícil de prever. É influenciado por uma combinação de fatores, como transtornos mentais, questões genéticas, socioculturais, psicodinâmicas, filosófico-existenciais e ambientais.

Compreender esse pressuposto é essencial para a próxima questão.

3. Pode ser prevenido

Embora não haja uma medida isolada que sirva para evitar todos os casos de suicídio, ele pode ser prevenido. A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem um vasto material a respeito, com orientações para a prevenção.

A adoção de medidas preventivas é ainda mais importantes se considerarmos que cerca de 75% dos casos (a OMS estima que ocorram cerca de 800 mil casos de suicídio por ano no mundo) acontecem em países de renda baixa e média que nem sempre podem contar com sistemas de saúde acessíveis a toda a população.

4. Comportamento suicida é um problema que vai além do suicídio em si

O número de tentativas de suicídios é cerca de 20 vezes maior que o número de suicídios. Uma pessoa que tenha tentado o suicídio tem um risco muito alto de conseguir no futuro, por isso é importante concentrar a atenção em pessoas que já tenham tido comportamento suicida, que também inclui intenção e pensamento suicida (ideação) e o planejamento do ato.

Embora muita gente pense que quem ameaça se matar está, na verdade, querendo chamar a atenção, toda ameaça de suicídio deve ser levada a sério. É comum que pessoas que tenham morrido por suicídio tenham feito ameaças ou tentativas anteriormente.

5. É preciso melhorar o diagnóstico e o tratamento dos transtornos mentais

O psiquiatra e professor de psiquiatria da Unicamp Luís Fernando Tófoli, em entrevista ao Portal Drauzio Varella, explicou que é extremamente importante identificar os sinais de transtornos mentais que em geral estão relacionados a comportamentos suicidas, como depressão e transtorno bipolar, para que as pessoas possam ser cuidadas.

Embora os transtornos não sejam determinantes, na maioria dos casos de suicídio é possível identificar, mesmo que posteriormente, a ocorrência de transtornos mentais.

Dessa forma, investir no diagnóstico e no tratamento desses transtornos pode ajudar a reduzir as taxas de suicídio, principalmente se isso vier acompanhado de outras medidas preventivas.

6. É fundamental investir na formação de profissionais de saúde

Profissionais de saúde devem desenvolver a atenção para suas próprias atitudes e tabus em relação à prevenção do suicídio e dos transtornos mentais. Há muito estigma envolvendo o tema, o que faz com que as pessoas deixem de pedir ajuda.

Tentativas de suicídio causam sentimentos ambíguos em quem está próximo, e isso inclui os profissionais de saúde. Entender e aprender a lidar com as emoções e preconceitos é fundamental.

7. É primordial cuidar dos familiares e das pessoas próximas

Não é fácil encarar casos de suicídios. Há muito estigma, e é comum que as pessoas próximas tenham sentimentos contraditórios, como raiva e culpa. Parentes de pessoas que morreram por suicídio também podem apresentar risco maior de se suicidar, portanto devem ser acompanhados.

8. É essencial identificar e reduzir a disponibilidade e o acesso aos meios para se cometer suicídio.

"Países que adotaram medidas para dificultar o acesso a medicamentos, armas de fogo e pesticidas, meios que costumam ser usados em tentativas de suicídio, conseguiram reduzir suas taxas", revelou em entrevista o psiquiatra Carlos Cais, professor-colaborador do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

A OMS tem feito inúmeros alertas nesse sentido aos seus países-membros.

9. É crucial auxiliar a mídia sobre como noticiar suicídios

Embora a mídia tenha obrigação social de abordar o tema, é preciso cuidado ao fazê-lo. Há consenso entre especialistas de que o fenômeno do suicídio sofre contágio pela imprensa, portanto há maneiras pelas quais ele não deva ser retratado. O dr. Tófoli ressaltou que o ato não deve ser romantizado nem se deve revelar detalhes, como cartas deixadas a parentes ou o local e o método utilizado.

A imprensa deve sempre buscar profissionais especializados e indicar fontes seguras para ajuda profissional.

O site Setembro Amarelo, feito em parceria com a Associação Brasileira de Psiquiatria e o Conselho Federal de Medicina, traz informações e indicação de profissionais confiáveis.

Peça ajuda

Caso você tenha pensamentos suicidas, procure ajuda especializada como o CVV e os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) da sua cidade.

O CVV (www.cvv.org.br/) funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por email, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil.

Fonte: www.uol.com.br/vivabem/colunas/mariana-varella/2022/03/16/suicidio-o-que-precisamos-saber.htm
 

quarta-feira, 16 de março de 2022

Países como o Brasil deixam de diagnosticar e tratar 70% dos casos de depressão

A depressão afeta 5% da população adulta, é considerada uma das doenças mais incapacitantes, mas metade dos casos ainda é negligenciada nos países desenvolvidos. Em países de baixa ou média renda, como o Brasil, a falta de diagnóstico e tratamento atinge mais de 70% das pessoas com o problema.

Os dados constam em um relatório da Associação Mundial de Psiquiatria sobre Depressão e da revista científica The Lancet, que será divulgado em um seminário internacional nesta quarta-feira (16 de fevereiro).

Elaborado por 25 pesquisadores de 11 países e de diversas disciplinas – da saúde pública à neurociência – , o documento chama a atenção para o descaso com que os países têm lidado com a grave crise global de depressão e pede um engajamento de toda a sociedade no enfrentamento.

Entre as propostas está a capacitação de outros profissionais não médicos, de pessoas da comunidade e de jovens que já tiveram depressão e estejam dispostos a ajudar outros que passam pelo mesmo problema.

Com o isolamento social, o luto, as dificuldades e o acesso limitado aos cuidados de saúde provocados pela pandemia de Covid-19, a saúde mental das pessoas se deteriorou ainda mais e, segundo o relatório, há um "tsunami" de necessidades não atendidas nessa área.

O psiquiatra Christian Kieling, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e coeditor do relatório, diz que a meta foi concentrar no documento todo o conhecimento acumulado até agora sobre depressão, as barreiras e os caminhos para enfrentá-la.

"Tem muita coisa que a gente ainda não sabe sobre depressão e que precisamos investir em pesquisas para avançar, mas tem muito que a gente já sabe como prevenir e tratar depressão. Infelizmente, a maior parte do planeta não tem acesso."

Os pesquisadores apoiam uma abordagem personalizada da depressão, que reconheça a cronologia e a intensidade dos sintomas. E recomendam intervenções adaptadas às necessidades específicas do indivíduo, à gravidade da doença e aos recursos disponíveis.

Entre as estratégias estão desde autoajuda e mudanças no estilo de vida até terapias psicológicas, antidepressivos e  tratamentos mais intensivos, como terapia eletroconvulsiva (ECT), para as formas graves e refratárias da doença.

"Há até estratégias de interação social e convívio social para a terceira idade. Hoje, a gente vê claramente a associação entre solidão e depressão em idosos", diz Kieling.

O relatório menciona intervenções terapêuticas na comunidade, como o Banco da Amizade, projeto desenvolvido pelo psiquiatra Dixon Chibanda, do Zimbábue, em que as avós são treinadas com técnicas de terapias com evidências científicas.

Elas adaptam o conhecimento à realidade das comunidades onde vivem. Por exemplo, terminologias como "depressão" e "ideação suicida" não são usadas. É preciso falar a língua dos pacientes por meio de conceitos culturais com os quais eles se identificam. Na cultura shona (povos de línguas bantas que habitam o Zimbábue), a terapia seria algo para "abrir a mente, fortalecer e animar o espírito".

Segundo Christian Kieling, há evidências bem robustas sobre a eficácia desse conceito de cuidados colaborativos. "Se eu capacitar pessoas, sob supervisão do médico de família da UBS, envolvendo outros membros da comunidade, como escolas, serviços sociais, grupos religiosos, com o paciente no centro, é possível oferecer um cuidado tão eficaz ou mais do que aquele oferecido pelo especialista."

O engajamento de pessoas que já passaram por episódios de depressão no cuidado de outras que agora enfrentam o problema é uma outra estratégia que se mostra exitosa. Na Austrália, por exemplo, jovens que já vivenciaram a depressão ajudam outros.

"O jovem, muitas vezes, não vai buscar ajuda formal no sistema de saúde. O jovem que está pensando em suicídio não vai acordar às 5h da manhã para entrar numa fila do posto de saúde e pegar uma ficha para ser atendido. Nem vai falar para a família, nem vai falar para a escola. Mas de repente vai falar para o melhor amigo, a melhor amiga", diz Kieling, especializado no público infantojuvenil.

O documento também alerta que são necessárias  estratégias que reduzam a exposição a experiências adversas na infância (como violência, negligência e traumas) para diminuir a prevalência de depressão na vida adulta.

Há ainda fatores de risco associados à depressão que podem ser prevenidos por políticas públicas, como tabagismo, consumo de álcool,  inatividade física, violência doméstica, luto e crise financeira. Grupos desprivilegiados do ponto de vista socioeconômico, que passam por situações de discriminação por raça ou gênero, e as mulheres também são mais suscetíveis à doença.

"A prevenção é o aspecto mais negligenciado da depressão. Isso em parte porque a maioria das intervenções está fora do setor de saúde", afirma Lakshmi Vijayakumar, do Centro de Prevenção do Suicídio e Serviços Voluntários de Saúde, em Chennai (Índia), coautor do relatório.

"Diante dos efeitos duradouros da depressão na adolescência, desde dificuldades na escola e relacionamentos futuros até o risco de abuso de substâncias, automutilação e suicídio, investir na prevenção da depressão é uma excelente relação custo-benefício."

Christian Kieling, da UFRGS, reforça também a necessidade de prevenir a cronificação da depressão. "A gente sabe que muitas pessoas vão ter um episódio depressivo e nunca mais terão outros. Mas existe uma parcela de indivíduos que pode ter novos episódios."

Nesses casos, há evidências na literatura mostrando que a psicoterapia, associada ou não à medicação, apresenta resultados melhores do que o tratamento só com o uso de medicamentos.

De acordo com o relatório, na pior das hipóteses, a depressão pode levar ao suicídio. Estudos indicam que cerca de metade das pessoas que se matam em países de baixa e média renda sofre de doenças mentais, das quais a depressão é a causa mais comum – nos países de alta renda, a taxa chega a 80%.

Lutar contra o estigma que ainda envolve a doença é um outro desafio. Uma das estratégias tem sido "empoderar" as pessoas que vivem com depressão, trazendo-as para uma posição mais ativa no debate. "A gente aprendeu que a biologização excessiva pode trazer um certo fatalismo, tipo eu tenho uma predisposição genética e não há nada que eu possa fazer."

Os pesquisadores também enfatizam que o atual sistema de classificação de pessoas com sintomas de depressão em apenas duas categorias (depressão clínica ou não) é muito simplista.

"Dois indivíduos não compartilham a história de vida e constituição exatas, o que acaba levando a uma experiência única de depressão e diferentes necessidades de ajuda, apoio e tratamento", explica Vikram Patel, da Harvard Medical School e também o coautor do relatório.

O documento reforça ainda que a depressão tem um custo social e econômico enorme e ainda pouco reconhecido. Mesmo antes da pandemia da Covid-19, a perda de produtividade econômica global ligada à depressão era cerca de US$ 1 trilhão por ano.

"Não há outra condição de saúde que seja tão comum, tão onerosa, tão universal ou tão tratável quanto a depressão, mas que recebe pouca atenção e recursos nas políticas", diz Kieling.

O relatório "Lancet-World Psychiatric Association Commission: time for united action on depression" será divulgado nesta quarta (16) durante um seminário internacional.

Fonte: www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2022/02/paises-como-o-brasil-deixam-de-diagnosticar-e-tratar-70-dos-casos-de-depressao.shtml

terça-feira, 8 de março de 2022

‘Com a Covid-19, os sintomas mentais aumentaram’ diz psiquiatra do Hospital Allan Kardec

Em meio ao Janeiro Branco, psiquiatra do Hospital Allan Kardec fala sobre a importância de discutir e cuidar da saúde mental, principalmente em meio ao período pandêmico que o mundo vive

A saúde mental nunca esteve tão em pauta. Em tempos de pandemia, o cuidado e atenção com a saúde mental ganharam tanta relevância. Durante o janeiro branco, mês em que a população é convidada a debater os assuntos ligados à mente, para a psiquiatra Thaís Bassi Cardoso, médica assistente no Hospital Allan Kardec, está cada vez mais claro para a população que cada ser humano pode, sim, precisar de ajuda na área de saúde mental, em algum momento da vida. E isso não é visto mais como um problema. “E esse, para mim, acaba sendo um motivo de otimismo em frente ao caos pandêmico que a gente está vivendo”, afirmou a profissional.

Acompanhe a seguir a entrevista com dra. Thaís.

O que é o Janeiro Branco?

A gente pode ver que, em todos os meses do ano, são feitas campanhas como uma forma de conscientização da população a respeito dos temas de saúde que são mais prevalentes, mais importantes. É uma conscientização pensando, tanto na prevenção, quanto na busca por ajuda, desmistificação dos conceitos que a gente tem saúde-doença. E alguns exemplos que são mais conhecidos nossos, que eu poderia citar, seriam o Outubro Rosa, que é a campanha do câncer de mama, e o Novembro Azul, e a prevenção do câncer de próstata. A gente tem também o Setembro Amarelo, que é o mês da prevenção do suicídio. E temos também o Janeiro Branco, como uma forma de promoção em Saúde Mental, e que teve como inspiração boa parte dessas campanhas que eu acabei de citar.

Qual a importância de destacar e discutir a Saúde Mental durante um mês?

A Organização Mundial de Saúde, a OMS, tem mostrado alguns dados são alarmantes e algumas projeções que também são bem preocupantes, no que diz respeito ao aumento na taxa dos transtornos mentais. O que significa, de uma forma direta e indireta, que a gente está falando em aumento da mortalidade, em aumento de morbidade, incapacidade funcional, laboral, além, também, de vários outros prejuízos sociais na vida do indivíduo.

A gente tem, em média, 800 mil casos de suicídio no mundo ao longo do ano. A depressão foi a principal causa de afastamento do trabalho em 2020 e ficou à frente de doença cardiovascular, por exemplo, e doença ortopédica, que também é bem frequente. O Brasil é o campeão mundial de ansiedade. Esses são só alguns dados, mas são uma mostra do que a gente está vivendo e isso, por si só, já justifica a gente abordar com muito cuidado esse tema, que é muito delicado. Foi então que, em 2014, um grupo de psicólogos “mineirinhos”, lá de Uberlândia, elaboraram uma proposta do Janeiro Branco, inspirado na campanha do Outubro Rosa, principalmente.

Aquilo, que teve início mais como uma forma local, regional, ao longo dos anos, principalmente a partir de 2016, vem crescendo de uma forma intensa. Ainda bem, né? E passou a adquirir um caráter nacional. Isso graças ao empenho dos estudantes, dos profissionais, da área PSI – tanto psicólogo, psiquiatra, alunos de residência e especialização, terapeuta ocupacional, nutricionista e vários outros.

É feita, então, uma divulgação, uma troca de conhecimento, informação, seja pela internet, rádio, programa de TV, as ações locais mesmo nas instituições que podem ser tanto públicas, quanto privadas, plano de saúde, UBS, hospital, ambulatório e os espaços comunitários também. É óbvio que esse complexo assunto aí da Saúde Mental não vai se esgotar ao longo desse mês de janeiro.

A importância (do Janeiro Branco), a gente percebe isso, que se faz necessário, ao longo do ano inteiro. Mas este mês acaba sendo um mês de destaque, que é dado a esse tema e que permite à gente, que abre a possibilidade de a gente fornecer a informação para a população, esclarecer sobre como agir, o que pode ser feito toda vez que a gente identifica alguém que esteja em sofrimento mental.

Hoje vemos que a Saúde Mental é mais debatida entre a sociedade, mas podemos dizer que ainda há muita resistência?

Para mim é nítido, hoje, que esse tema tem sido mais debatido entre a sociedade, mas que ainda a gente encontra muita resistência. Por muito tempo, reinava aquele estigma de que o psiquiatra era o médico de louco, várias piadinhas circulando a respeito do atendimento em psiquiatria. Um exemplo: tem gente que brinca que a diferença entre o paciente e o psiquiatra é que o psiquiatra tem a chave do consultório. A gente percebe até mesmo no meio médico. Muitas vezes, a gente acaba sendo menosprezado enquanto psiquiatra. Tudo isso faz com que as pessoas demorem a buscar ajuda, seja por medo, preconceito, resistência.

Com a pandemia, esses problemas aumentaram?

Eu não queria mostrar uma positividade, assim um otimismo tóxico, agora. É claro que é a pandemia tem sido catastrófica. Destruiu várias vidas, várias famílias. Acho que os prejuízos são incontáveis e de várias ordens. Mas apesar desse cenário trágico, um exercício que eu acho interessante de a gente fazer é tentar observar que, assim, em meio a tudo isso, o que dá para a gente aprender? Uma das lições que eu tenho visto diz respeito justamente a isso, que é o estigma da psiquiatria. Por quê? Com a Covid-19, a gente viu aumentar – e muito – os sintomas mentais.

Como esse processo que a gente vive é dinâmico e a pandemia ainda não acabou, é bem possível que esses dados sofram alguma modificação ao longo do tempo. Mas, de maneira geral, a gente viu uma piora dos sintomas em quem já era paciente atendido em Saúde Mental. A gente viu também uma incidência maior de transtorno, tanto depressivo quanto ansioso, nos pacientes que tiveram Covid. A gente viu também casos associados à infecção pelo coronavírus; alteração neurológica, como, por exemplo, encefalite; muito prejuízo de atenção, prejuízo de memória. E para ser mais precisa, uma metanálise mostra que teve um aumento de 30% dos transtornos mentais neuropsiquiátricos nos pacientes que tiveram Covid.

Uma outra coisa que a gente percebe é que os adolescentes e os escolares foram mais afetados. O Burnout, ou esgotamento em português, nos profissionais de saúde da linha de frente…

Mas por outro lado, um dado interessante, é que a população de uma forma geral experimentou, sim, o aumento dos sintomas. Mas percebam que eu falo sintoma e não transtorno. Então, aumento nos sintomas ansiosos e depressivos, que a gente pode acabar considerando como reativo a essa situação, como se fosse uma forma de adaptação que a gente está vivendo. E interessante também que esses sintomas, depois de um ano, voltaram ao patamar dos níveis que a gente tinha antes da pandemia, os níveis pré-pandemia. Ou seja, isso mostra que apesar de a gente estar sofrendo com isso, a gente tem conseguido agora apresentar uma certa resiliência e uma capacidade de adaptação. A pergunta é: até quando? Mas a gente tem visto isso. E eu acho que todo esse chacoalhão e os casos que a gente vê pipocando, tanto em hospital quanto em consultório, felizmente fizeram com que boa parte das pessoas percebesse que é – entre aspas – normal não se sentir bem e plenamente adaptado, a maior parte do tempo. E que isso não necessariamente é sinal de loucura, de doideira ou qualquer outra coisa do tipo.

Tem ficado claro que cada um de nós pode precisar de ajuda, em algum momento da vida. E esse, para mim, acaba sendo um motivo de otimismo em frente ao caos pandêmico que a gente está vivendo.

Antes falava-se muito em “doença mental” e hoje o termo “saúde mental” é mais utilizado. Mudanças como essa ajudam a desmistificar o tema?

E falando também em estigma e preconceito, é interessante a gente perceber que antes falava-se muito em doença mental e hoje a gente tem observado algumas mudanças graduais nos termos que a gente usa. Apesar de serem algumas mudanças que, no primeiro momento, possam parecer simples, mostram uma grande quebra de paradigma.

Hoje em dia, a gente diz “transtorno” mental e não “doença”. O termo “psiquiatria” vem, muitas vezes, sendo substituído por “saúde mental”.

E o que isso significa em termos práticos? A gente tira o paciente do patamar de doente e a gente considera que ele pode, sim, ter uma variação do estado de saúde, que pode causar um incômodo, que pode comprometer o dia a dia dele, causa sofrimento, prejuízo, tanto para ele quanto nas relações interpessoais, no trabalho, com a família, com os amigos, por exemplo. E essa mudança é uma coisa muito positiva.

Podemos falar em problemas, transtornos mentais decorrentes do modo de vida da sociedade atual?

De um modo geral, a gente tem visto uma tendência de aumento nos transtornos mentais. Isso pode acontecer tanto porque a gente tem falado mais em Saúde Mental, mas também pelo nosso modo de viver a vida. Tem uma frase que eu sempre falo com os pacientes, que diz: “Não é sinal de saúde ser adaptado a uma sociedade extremamente doente”. Então, eu não acho saudável, por exemplo, um funcionário tomar medicação para dormir, outra para ele se manter ativo, ficar disposto e com energia ao longo do dia. E junto a gente associa um antidepressivo para ele dar conta de se manter em um trabalho que, às vezes, é exaustivo e deixa ele esgotado. O termo Burnout nunca foi tão usado. E eu também não acho saudável a gente ver a cobrança, a autocobrança extrema e autodestrutiva que a gente vê nos estudantes universitários, que estão pipocando nos consultórios médicos.

E como eu falei antes, o Brasil é o “número um” em ansiedade no mundo. Quando a gente fala de depressão, é o quarto na América Latina. E isso não pode ser considerado normal. Eu acho que a gente precisa, com urgência, repensar o nosso modo de vida e de enfrentamento das dificuldades que a gente tem ao longo da vida.

A dra. tem dicas de como a população pode cuidar da saúde mental, em meio a esse vai e vem da pandemia?

Há algumas dicas que eu poderia pensar a respeito disso, do autocuidado, justamente nesse período delicado que a gente está vivendo e que passa justamente por isso, o nosso modo de vida. Eu acredito assim fortemente na prevenção. Aquela máxima que a gente vê “prevenir é melhor que remediar”, para mim sempre foi muito verdadeira. Na medida do possível, uma alimentação com escolhas mais conscientes; atividade física, pensando tanto na melhora cardiovascular, de resistência, hipertrofia e tal, mas também na promoção de bem-estar emocional, porque a gente sabe, é científico, que há aumento das endorfinas, que isso também diminui a sensação de ansiedade, de depressão; uma boa noite de sono; interação social, na medida do possível – ou seja, videochamada também está valendo.

São todas essas medidas não medicamentosas que podem ajudar bastante, ser um grande aliado, um fator protetor quando a gente pensa em manter a nossa sanidade mental.

Por fim, a pessoa que sinta que necessita de ajuda na área de Saúde Mental ou até um parente ou conhecido, como proceder?

Se você ou alguém próximo sentir que, mesmo com essas medidas não medicamentosas, seguindo essas orientações, está difícil caminhar e continuar, é a hora de a gente pôr o nosso próprio preconceito de lado e buscar ajuda. E essa ajuda pode ser desde os grupos sociais, grupo de autoajuda, grupo que envolve religiosidade, espiritualidade, quanto também uma ajuda mais formal: a psicoterapia, com os psicólogos, é sempre uma ferramenta muito importante de autoconhecimento e que pode ajudar a gente a promover em nós mesmos algumas mudanças que, às vezes antes, seriam impensáveis.

E além disso, uma avaliação do psiquiatra pode ser útil. Isso não quer dizer que você vai sair do consultório com uma prescrição de tarja preta na mão. Mas, muitas vezes, é uma questão de receber uma orientação que é importante naquele momento. Acho que se eu pudesse resumir, bem rapidamente o que eu falei aqui, para mim o principal seria: a nossa vida, a sua vida é muito preciosa. Não vale, por resistência ou qualquer outro motivo que seja, arrastar uma situação que é penosa e que vai ser fonte de sofrimento. E eu não estou dizendo, com isso, que o tratamento vai eliminar qualquer dificuldade que é inerente da vida, que a gente vai passar por elas. Mas pode tornar essa jornada muito mais leve. Então, para mim, a mensagem final seria: “cuidem-se”.

Fonte: https://folhadefranca.com.br/especiais/com-a-covid-19-os-sintomas-mentais-aumentaram-diz-psiquiatra-do-hospital-allan-kardec/

Os “anjos” que salvaram vidas em ponte dos EUA 



Nos Estados Unidos existe um grupo, apelidado como anjos, que tenta impedir as pessoas de pularem de pontes.

“Nenhuma pessoa que vem à ponte para pular quer morrer. Elas só querem saber que alguém se importa”, afirma Kevin Hines, que tentou dar fim à sua vida saltando da Golden Gate, em São Francisco, nos Estados Unidos, em setembro de 2000.

Mesmo que muitas pessoas tenham o visto na ponte, ninguém notou que Hines estava angustiado ou perguntou se alguma coisa estava errada. Apesar dele pular, o homem sobreviveu à queda de 75 metros nas águas frias do Pacífico. Porém, de acordo com dados oficiais, mais de 1,7 mil pessoas morreram ao pular desse local desde que foi inaugurado, em maio de 1937.

A Bridgewatch Angels (anjos da brigada da ponte) se dedica a encontrar potenciais suicidas que vão até a ponte com o objetivo de salvar as suas vidas escutando os que eles têm a dizer. Para fins comparativos, é apresentado que no ano de 2018, 214 pessoas tentaram pular e apenas 27 de fato pularam, o que mostra o sucesso desse trabalho voluntário, realizado em conjunto com a polícia.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima-se que ocorram 800 mil suicídios no mundo por ano. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), a principal agência de saúde pública dos Estados Unidos, acrescenta que o suicídio é a segunda maior causa de morte entre os americanos com idades entre 10 e 34 anos.

Além disso, dados da Save, uma organização americana de conscientização e prevenção de suicídio, apontam que 90% das pessoas que morrem por suicídio têm algum problema de saúde mental. Outro fator é o consumo de substâncias químicas de forma abusiva no momento da morte. 

O trabalho da Bridgewatch Angels


Mesmo que a depressão seja um problema de saúde mental tratável, o suicídio costuma ser considerado um ato impulsivo. Por isso, os anjos da ponte tentam impedir que o suicídio, que é uma forma de interromper a possibilidade de recuperação de uma pessoa.

Embora more na região, a policial Mia Munayer não conhecia esse lado da ponte Golden Gate. Ela só descobriu em 2010, ao assistir o documentário The Bridge.

“Tinha que fazer algo para ajudar a impedir que mais pessoas morressem”, afirma ela, que fundou então a Bridgewatch Angels, em 2011. Desde então, os voluntários percorrem a ponte em datas comemorativas, como Natal, e são treinados para conversar com qualquer pessoa que acreditem estar em perigo.

Munayer investiu mais de US$ 10 mil (R$ 41,5 mil) do próprio bolso para financiar as campanhas. Nelas são realizados seminários para pessoas interessadas em auxiliar a ponte em épocas comemorativas.

A polícia ensina os voluntários a lidar com aqueles que parecem estar isolados e angustiados, assim como aprendem a notar os sinais de alerta. As perguntas podem ser iniciadas com um “você está bem?”.

“Conversamos com as pessoas. Mostramos que não estão sozinhas. Nós ouvimos. Às vezes, essa é a melhor resposta. Mas é importante tentar não tocar nos assuntos sensíveis e apenas mantê-las conversando”, conta Munayer.

O guardião da ponte


Kevin Briggs, sargento aposentado, faz trabalho similar. Por cerca de 20 anos, a ponte Golden Gate fez parte da sua patrulha diária e com isso ele se envolveu com a causa. O primeiro contato que teve com um suicidas foi em 1994.

“Na época, os policiais não tinham treinamento formal para lidar com essas situações. Fiquei aterrorizado quando vi uma jovem subindo no beiral”, conta Briggs.

Após isso, ele começou a ler sobre como lidar com suicidas. “Foi uma boa ideia, porque, por quase 20 anos, tive de lidar com essas situações com muita frequência.”

“Às vezes, eu me questionava sobre as pessoas que salvei, como se fosse uma pesquisa. ‘O que eu disse de bom? O que eu disse ou fiz de ruim?'”, afirma.

Ele foi apelidado como o guardião da Golden Bate por ter convencido 200 pessoas a não pular da ponte, fracassando apenas em dois momentos. “Você costuma se lembrar mais das pessoas com quem falhou do que daquelas que ajudou”, conta. Por causa disso, ele desenvolveu um distúrbio de estresse pós-traumático.

O ex-policial ficou famoso em 2005, após ser documentado ele resgatando Kevin Berthia, de 22 anos, que enfrentava depressão e tinha uma dívida de US$ 250 mil, por causa do tratamento da filha prematura. Briggs afirma que após 90 minutos de conversa, o homem desistiu de pular. Oito anos depois, Berthia entregou a Briggs um prêmio da Fundação Americana para Prevenção do Suicídio.

Depois de anos de discussão, em 2018 começou a construção de uma rede de seis metros de largura, localizada seis metros abaixo da ponte. De acordo com informações, a proteção custou US$ 200 milhões.




Para Munayer, iniciativas como o documentário “The Bridge” confrontam o que ela chama de mitos do suicídio. “Às vezes, o simples ato de iniciar uma conversa casual pode ser suficiente para dissuadir alguém de tirar a própria vida. Então, por que não deveríamos debater essa questão mais abertamente na sociedade?”

Raro os casos das pessoas que saltam e sobrevivem para contar a sobrevivência. De acordo com dados oficiais, pular da ponte Golden Gate, e atingir a água a quase 140 km/h, representa uma taxa de mortalidade de mais de 95%.

Os poucos sobreviventes relatam ter se arrependido da decisão logo após pular. “Essa ponte é uma mensageira da morte”, afirmou Kevin Hines, que pulou em agosto de 2000, para a emissora CNN.

“Eu não teria feito isso se alguém tivesse me abordado. Eu estava chorando e desorientado. Ninguém parou para perguntar o que estava errado. Finalmente, uma turista me parou. Ela queria uma foto sua. Concordei, e cinco cliques depois, eu ainda estava chorando, e ela foi embora. Eu sabia que ninguém se importava. Dei um passo para trás e me joguei.”

Hines, agora é um ativista em questões de saúde mental e prevenção de suicídios. “Se você vê alguém sofrendo, é seu dever se envolver e tentar fazer a pessoa se abrir e compartilhar o que está acontecendo em sua mente. Você pode ser um agente de mudança.”

Além disso, o Centro de Valorização da Vida (CVV) possui serviços de apoio emocional e prevenção de suicídio, gratuitamente e 24 horas por dia. As ligações podem ser realizadas pelo número 188. Também pode acessar www.cvv.org.br para chat, Skype, e-mail e outras informações sobre a ligação. 

Fonte: www.fatosdesconhecidos.com.br/os-anjos-que-salvaram-vidas-em-ponte-dos-eua/ 

segunda-feira, 7 de março de 2022

Falar sobre prevenção ao suicídio deve ser um hábito do ano inteiro, alertam especialistas 

Cerca de 3 mil pessoas tiraram a vida nos últimos cinco anos no Ceará, levando o Estado a ocupar o quinto no lugar no ranking nacional no período de 2011 a 2015

(4 março 2022)

Falar sobre prevenção ao suicídio não deve ser um assunto restrito apenas a um mês, por meio da conhecida campanha brasileira de nome Setembro Amarelo. O assunto, que é uma questão de saúde pública, merece máxima atenção também em outros meses do ano, uma vez que cerca de 800 mil pessoas no mundo morrem por suicídio anualmente, de acordo com um levantamento feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

No Brasil, o número também assusta: mais de 11 mil pessoas entre 15 e 44 anos cometem suicídio por ano. Ainda, segundo o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), a região do Nordeste apresentou aumento de 51,7% dos casos, enquanto aproximadamente 3 mil pessoas tiraram a vida nos últimos cinco anos no Ceará, levando o Estado a ocupar o quinto lugar no ranking nacional no período de 2011 a 2015.
 
A OMS estima, ainda, que as tentativas de suicídio sejam cerca de 20 vezes mais frequentes do que o suicídio consumado, além de existirem, pelo menos, quatro tentativas não registradas para cada tentativa oficialmente registrada. Dessa forma, o Ministério Público do Ceará (MPCE), por meio do Plano Nacional de Prevenção ao Suicídio, atua com o programa Vidas Preservadas, que articula ações como forma de combater essa problemática.

o programa promove uma abordagem intersetorial sobre o suicídio em parceria com um grupo de órgãos públicos e de organizações não governamentais do Estado, de modo a fomentar o debate e estimular a sensibilização e o fortalecimento de políticas públicas para a promoção da saúde e para o surgimento de estratégias de cuidado integral da população na perspectiva do trabalho em rede. Além disso, ele oferece capacitação para profissionais e planejamento estratégico para os municípios.

Um dos membros do programa, a psicóloga Alessandra Silva Xavier, doutora em Psicologia Clínica e especialista em Psicoterapia Psicanalítica, explica que o pensamento suicida é desencadeado, muitas vezes, por mais de um motivo. “É muito importante compreender que o suicídio não é um fenômeno simples, é um fenômeno complexo, multicausal, que significa que não tem apenas um único fator”, pontua.

Os fatores que levam ao suicídio, segundo a especialista, podem estar relacionados ao estresse, impulsividade, desesperança, rigidez cognitiva, ausência de vínculos afetivos, existência ou presença de violência ao longo do desenvolvimento, além da falta de vínculos protetivos, como os pais, por exemplo. Além disso, o suicídio é comum em pessoas com sofrimento psíquico intenso e dores avassaladoras que não são sanadas.

Alguns fatores sociais, como fome, desemprego e falta de moradia também podem levar pessoas ao sofrimento intenso e ao suicídio, segundo a psicóloga Nimara Lourenço Araújo, pós-graduanda em Gestalt Terapia que também faz parte do programa Vidas Preservadas. “Apesar das estatísticas apontarem para um cenário em que somente pessoas com depressão têm comportamentos suicidas, o fenômeno não está diretamente ligado ao transtorno depressivo”, pontua.

Pessoas com transtorno de boderline ou bipolaridade, aponta Nimara, também podem apresentar traços e características do comportamento suicida. Ainda, transtorno de ansiedade, esquizofrenia e consumo abusivo de drogas e álcool também podem desencadear tais comportamentos. Ter uma patologia psíquica, no entanto, não é fator determinante para a existência de tendências suicidas. É necessário haver avaliação profissional.

"É importante que as pessoas considerem que as doenças mentais estão para todas as pessoas, que não é um fracasso, falta de Deus ou preguiça. Infelizmente, a doença mental está repleta de elementos do imaginário, de elementos do senso comum e de elementos de preconceito, o que faz com que, muitas vezes, as pessoas tenham extrema dificuldade em reconhecer a necessidade de ajuda e de procurar ajuda", pontua a psicóloga Alessandra.

Tratamento

O tratamento dos casos dos transtornos mentais, segundo a especialista Alessandra, é complexo e multiprofissional, que pode exigir medicação, psicoterapia, atividade física, acompanhamento nutricional, fisioterapia, atividades em grupo, mudança de trabalho ou inserção em novos processos de aprendizagem. Dessa forma, o tratamento da depressão exige um reposicionamento da vida do sujeito de forma a considerá-lo na sua dimensão de autonomia e cidadania.

"É importantíssimo que o projeto terapêutico singular considere a existência de cada sujeito no seu processo com as suas demandas e que os objetivos e as estratégias sejam traçados em comum, tanto com o usuário como com a equipe de profissionais, porque as ações vão envolver uma série de intervenções, sendo importante a gente chamar a atenção para a necessidade desses profissionais serem acessíveis à população", pontua Alessandra.

A especialista completa: "Por isso, a gente sempre recomenda que é importante a busca de uma ajuda profissional, seja um profissional de saúde, que tenha uma formação na área para fazer os encaminhamentos adequados, porque quando isso fica no campo leigo, da boa vontade, nem sempre a pessoa vai receber os cuidados que ela precisa de acordo com a gravidade da situação, podendo agravar ainda mais o quadro".

Olhar atento ao próximo

As especialistas recomendam um olhar atento ao próximo para conseguir identificar possíveis sinais de pedidos de socorro que podem estar sendo dados. Nesses casos, elas recomendam que essas pessoas sejam levadas para centros especializados, a fim de receber atendimento de um profissional de saúde capacitado para a solucionar a problemática.

"Uma das coisas mais valiosas que a gente pode fazer para alguém que chega com um pedido de ajuda é ajudar essa pessoa a ser acolhida por um serviço que possa oferecer a ela o tratamento e a ajuda que ela precisa. Então, é fundamental se disponibilizar para procurar e ir junto com a pessoa até o serviço de saúde", recomenda Alessandra.

Atendimento do CBMCE

O Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (CBMCE) também tem importante papel em ações de prevenção ao suicídio em todo o Estado. "Existem ameaças suicidas que são ligadas diretamente para a Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops), onde o Corpo de Bombeiros atua. Há vários casos em que os agentes foram ao local e conseguiram salvar pessoas", explica o tenente coronel do CBMCE, José Edir Paixão de Sousa.

"Existem, também, casos de ameaças suicidas que são identificadas por meio de membros do programa Vidas Preservadas, onde eles entram em contato comigo e eu faço a solicitação junto com o Corpo de Bombeiros", completa o tenente. Além disso, o CBMCE também atua na parte de prevenção por meio de treinamentos, sendo o principal chamado Guardiões da Vida, além de palestras educativas ministradas sobre a temática de prevenção ao suicídio.

"O Guardiões da Vida para a segurança pública se baseia em ensinar sobre a teoria geral do suicídio e da prevenção do suicídio, ensinar a fazer escuta e diálogo em momentos de crises suicidas, e quando atuar depois que se perceber sinais de alerta verbais e comportamentais. Isso ajuda para que companheiros de trabalho possam ter esse olhar atento e humanizado, sabendo se portar sem julgar, sem comparar, utilizando estratégias de comunicação não violenta para poder ajudar", esclarece Edir.

Nessa quarta-feira, 2, o tenente lançou o livro "Saúde e Trabalho na Segurança Pública: reflexões científicas e experiências práticas", tendo distribuição gratuita aqui. "Além disso, eu estou representando o Brasil pelo CBMCE na Federação Internacional de Psicologia das Emergências. Os nossos trabalhos nessa área foram tão reconhecidos que recebemos convites para ministrar treinamentos online em institutos e instituições", completa Edir. 

Onde buscar ajuda [Ceará]?

Centro de Valorização da Vida – CVV
Atendimento 24h
R. Ministro Joaquim Bastos, 806 – Bairro de Fátima
https://www.cvv.org.br
Telefone: 188

Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará
Núcleo de Busca e Salvamento
Av. Presidente Castelo Branco, 1000 – Moura Brasil – Fortaleza-CE
Telefone: 193

Hospital de Saúde Mental de Messejana
Rua Vicente Nobre Macêdo, s/n – Messejana – Fortaleza/CE
www.hsmm.ce.gov.br
Telefone: (85) 3101 4348

Programa de Apoio à Vida – PRAVIDA/UFC
Rua Capitão Francisco Pedro, 1290 – Rodolfo Teófilo – Fortaleza/CE
www.pravida.com.br
contato.pravida@gmail.com
Telefone: (85) 3366 8149 / 98400 5672

Laboratório de Relações Interpessoais – L’ABRI/UFC
Avenida da Universidade, 2762 – Benfica – Fortaleza/CE
labriufc@gmail.com

Instituto Bia Dote
Av. Barão de Studart, 2360 – Sala 1106 – Aldeota – Fortaleza/CE
www.institutobiadote.org.br
contato@institutobiadote.org.br
institutobiadote@gmail.com
Telefone: (85) 3264 2992 / 99842 0403

Instituto DimiCuida
Av. Santos Dumont, 1388 – Aldeota – Fortaleza/CE
www.institutodimicuida.org.br
fabiana@institutodimicuida.org.br
Telefone: (85) 3255 8864 / 98131 1223

Centro de Apoio ao Sujeito no Luto – CASULU
facebook.com/casulupsi
Telefone: (85) 3109 6616 / 99996 7447  

Fonte: www.opovo.com.br/noticias/saude/2022/03/04/falar-sobre-prevencao-ao-suicidio-deve-ser-um-habito-do-ano-inteiro-alertam-especialistas.html

domingo, 6 de março de 2022

OMS pede atenção para problemas de saúde mental provocados pela pandemia

No primeiro ano da pandemia de Covid-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou 25%. Diretor geral diz que é "apenas a ponta do iceberg"

Por Simone Blanes (2 março 2022) 

No primeiro ano da pandemia de Covid-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou 25%, de acordo com um resumo científico divulgado nesta quarta-feira 2, pela Organização Mundial da Saúde (OMS). “As informações que temos agora sobre o impacto da Covid-19 na saúde mental do mundo são apenas a ponta do iceberg”, disse Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.

O relatório também destaca quem foi mais afetado e resume o efeito da pandemia na disponibilidade de serviços de saúde mental e como isso mudou durante a crise sanitária. Preocupações com possíveis aumentos nas condições de saúde mental já levaram 90% dos países pesquisados a incluir saúde mental e apoio psicossocial em seus planos de resposta à Covid-19, mas permanecem grandes lacunas e preocupações. “Este é um alerta para que todos os países prestem mais atenção à saúde mental e façam um trabalho melhor no apoio de suas populações”, completou Ghebreyesus.

Uma das principais explicações para o aumento é o estresse sem precedentes causado pelo isolamento social. Ligados a isso estavam as restrições à capacidade das pessoas de trabalhar, buscar apoio de entes queridos e se envolver em suas comunidades.

Solidão, medo da doença, sofrimento, sensação de morte iminente, luto e preocupações financeiras também foram citados como estressores que levaram à ansiedade e à depressão. Entre os profissionais de saúde, a exaustão tem sido um importante gatilho para o pensamento suicida.
Jovens e mulheres são os mais atingidos

O resumo, com uma revisão abrangente das evidências existentes sobre o impacto do Covid-19 na saúde mental e nos serviços de saúde mental e estimativas do último estudo Global Burden of Disease, joga luz aos jovens e mulheres, apontados como os mais afetados pela pandemia. No caso dos jovens, é preocupante porque correm um risco desproporcional de comportamentos suicidas e de automutilação. Já as mulheres severamente impactadas com condições de saúde física pré-existentes, como asma, câncer e doenças cardíacas, eram mais propensas a desenvolver sintomas de transtornos mentais.

Os dados sugerem ainda que pessoas com transtornos mentais pré-existentes não parecem ser desproporcionalmente vulneráveis à doença. No entanto, quando são infectadas, ficam mais propensas a sofrer hospitalização, doenças graves e morte em comparação com indivíduos mentalmente saudáveis. Pessoas com transtornos mentais mais graves como psicoses e jovens com transtornos mentais estão particularmente em risco, de acordo com o relatório.

Lacunas no cuidado

Esse aumento na prevalência de problemas de saúde mental coincidiu com graves interrupções nesses serviços, deixando enormes lacunas no atendimento daqueles que mais precisam. Durante grande parte da pandemia, os serviços para condições mentais, neurológicas e de uso de substâncias foram os mais afetados entre todos os essenciais de saúde relatados pelos Estados Membros da OMS. Muitos países também disseram ter grandes interrupções nos serviços de saúde mental que salvam vidas, inclusive na prevenção do suicídio.

No final de 2021, a situação melhorou um pouco, mas hoje muitas pessoas continuam incapazes de obter os cuidados e o apoio que precisam para condições de saúde mental pré-existentes e recém-desenvolvidas. Incapazes de acessar o atendimento presencial, muitas pessoas buscaram suporte online, sinalizando a necessidade urgente de disponibilizar ferramentas digitais confiáveis, eficazes e de fácil acesso. No entanto, desenvolver e implantar essas intervenções online continua sendo um grande desafio em países com recursos limitados.

Ação dos países

Desde os primeiros dias da pandemia, a OMS e seus parceiros têm trabalhado para desenvolver e divulgar recursos em vários idiomas e formatos para ajudar diferentes grupos a lidar com os impactos da Covid-19 na saúde mental. Por exemplo, o órgão produziu um livro de histórias para crianças de 6 a 11 anos, “My Hero is You”, disponível em 142 idiomas e 61 adaptações multimídia, bem como um kit de ferramentas para apoiar idosos, em 16 idiomas.

Ao mesmo tempo, a OMS tem recrutado parceiros, incluindo outras agências das Nações Unidas, organizações não-governamentais internacionais e as Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, para liderar uma resposta de saúde mental e psicossocial à doença. Ao longo da pandemia, a OMS se esforçou ainda para promover a integração da saúde mental e do apoio psicossocial em todos os aspectos de retorno global.

Os Estados Membros da OMS reconheceram o impacto da Covid-19 na saúde mental e estão tomando medidas. A mais recente pesquisa da Organização sobre a continuidade dos serviços essenciais de saúde indicou que 90% dos países estão trabalhando para fornecer saúde mental e apoio psicossocial aos pacientes e socorristas da doença. Além disso, na Assembleia Mundial da Saúde, no ano passado, os países enfatizaram a necessidade de desenvolver e fortalecer a saúde mental – adotaram o Plano de Ação Integral de Saúde Mental 2013-2030 – com o objetivo de preparar as pessoas para futuras emergências de saúde pública.

Aumento de investimento

No entanto, esse compromisso com a saúde mental precisa ser acompanhado por um aumento global de investimento. O relatório ressalta uma situação de escassez global crônica de recursos de saúde mental que continua até hoje. O mais recente Atlas de Saúde Mental, da OMS, mostrou que, em 2020, os governos em todo o mundo gastaram em média pouco mais de 2% de seus orçamentos em saúde mental. E muitos países de baixa renda relataram ter menos de 1 profissional de saúde mental para 100.000 habitantes. “Embora a pandemia tenha gerado interesse e preocupação pela saúde mental, também revelou um sub investimento histórico nesses serviços. Os países devem agir com urgência para garantir que o apoio à saúde mental esteja disponível para todos”, resume Dévora Kestel, diretora do Departamento de Saúde Mental e Uso de Substâncias da OMS.

Fonte: https://veja.abril.com.br/saude/oms-pede-atencao-para-problemas-de- saude-mental-provocados-pela-pandemia/