Ao voltar do Iraque, brigada enfrenta novos inimigos nos EUA
Por causa dos índices de suicídio, assassinato e abuso de drogas, soldados têm estatisticamente mais risco em casa que no Iraque
Por Timothy Williams (The New York Times)
Os soldados da Quarta Brigada da Primeira Divisão Blindada chegaram do Iraque há três meses e, com isso, o perigo de atiradores e bombas já não é uma ameaça.
A guerra para eles acabou. Mas as chances de que alguns deles sofram mortes violentas permanecem altas, por isso, assim como fazia quando seu batalhão estava operando no Iraque, o sargento major de comando Sa'eed Mustafa constantemente adverte seus soldados sobre os perigos de baixar a guarda onde deveriam se sentir mais seguros - em suas próprias casas. "Falamos sobre o inimigo daqui, que é diferente do inimigo de lá, mas que também é mortal", disse.
Durante todo o ano passado, apenas um dos soldados da unidade morreu em combate, mas, em 2008, a última vez em que a brigada esteve nos EUA, sete soldados foram mortos e outros seis cometeram crimes em que pelo menos quatro civis e militares de fora da brigada morreram em um pouco mais de um ano.
Drogas, incluindo heroína e um laboratório de metanfetamina, foram descobertos nos quartéis, bem como uma fita caseira de sexo que tem circulado entre os soldados sendo protagonizada por uma tenente da brigada e cinco sargentos.
"Estar de volta ao quartel é o que não sabemos fazer, porque, desde o 11 de Setembro, parece que passamos mais tempo em combate do que aqui", disse o tenente-coronel David Wilson.
Enquanto os militares americanos continuam a reduzir o número de soldados no Iraque - dos cerca de 85 mil atuais para 50 mil até o dia 1º de setembro -, começam a mudar seu foco para o fronte doméstico, em um esforço para garantir uma transição suave para os soldados, uma medida gerada por meio de lições aprendidas com veteranos que têm lutado para se adaptar à vida longe da guerra.
Os líderes da Quarta Brigada afirmam que seu problema não é apenas profundamente embaraçoso, mas também revela desconhecimento institucional a respeito do estresse de combate e dos traumas cerebrais que forçaram a unidade a adotar uma abordagem holística, que não é normalmente associada aos militares, para enfrentar seus problemas.
"Eles estavam saindo de uma zona de guerra, voltando para casa e não recebendo o atendimento e a supervisão necessários, o que lhes permitiu manter a mentalidade que adotam em Mossul", disse Mustafa, referindo-se à violenta cidade do norte do Iraque onde a brigada foi posicionada antes de voltar a Forte Bliss, em 2008. "Esse é um grupo de pessoas que estava lutando e matando e carregando feridos por 14 meses. Você não pode ligar e desligar seu funcionamento."
A brigada tem um dos piores antecedentes criminais do Exército, apesar de não haver estatísticas. Seus líderes dizem que, se conseguirem manter seus soldados em segurança até seu próximo desdobramento, sua abordagem multifacetada pode se tornar um modelo para outras unidades visando a adaptar seus próprios soldados ao período de paz.
Até agora, a estratégia parece funcionar: depois de passar quase três meses em Forte Bliss, o porta-voz major Caggins Myles disse que seus soldados haviam se envolvido em apenas alguns casos, sendo que o mais grave deles resultou em três detenções por direção embriagada sem vítimas.
Os métodos variam dos mais rígidos - expulsar dezenas de soldados do Exército e exigir que os grupos de três ou mais soldados marchem, em vez de caminhar, sempre que estão na base - aos mais suaves, como ligar para os pais para contar que seus filhos realizaram um trabalho exemplar no Iraque e trazer um trabalhador social civil para aconselhar soldados deprimidos.
A brigada também expandiu sua lista de soldados em risco para incluir aqueles que o Exército não teria considerado anteriormente, como soldados com múltiplas infrações de trânsito. Após a chegada em Forte Bliss, soldados considerados de maior risco de desenvolver problemas psicológicos são reunidos na pista de pouso e escoltados para uma entrevista com um conselheiro, por vezes com os membros da família a tiracolo.
Wilson disse que ordenou que seus soldados do batalhão leiam "Quem Mexeu no Meu Queijo?", de Spencer Johnson, para ajudá-los a lidar com mudanças.
A unidade também tem treinado seus líderes em programas de prevenção do suicídio que excedem as exigências do Exército, e seus oficiais, incluindo o comandante da brigada, o coronel Peter A. Newell, tem frequentado bares ao redor de Forte Worth para monitorar o comportamento de seus soldados.
Sargentos são incentivados a espionar a vida pessoal dos soldados perguntando sobre a situação de seus casamentos e o estado de suas finanças. Além disso, antes de ir embora cada soldado que possui carro passa por uma inspeção do veículo e tem que apresentar o comprovante de seguro e carteira de motorista.
"Há um desejo ardente de mudar as Forças Armadas", disse Newell. "Tínhamos de fazer alguma coisa ou iríamos afundar depois de oito anos de guerra."
Um aspecto crucial da sua abordagem é o escalonamento dos momentos de transferência da liderança da brigada de modo que os sargentos e oficiais do mais alto escalão não sejam transferidos ao mesmo tempo, o que normalmente ocorre em unidades do Exército poucos meses após o retorno da guerra.
Durante uma breve instrução para cerca de 360 soldados na Base Operacional de Contingência Adder, no sul do Iraque, Newell caminhava de um lado para o outro diante deles dizendo que se sentia desconfortável com seu regresso iminente a Forte Bliss.
"Sinto um certo estresse de ter de enviar uma brigada para casa", disse. "A triste verdade é que é mais seguro mantê-los no Iraque entrando em combate com pessoas que tentam matá-los do que levá-los de volta para casa."
Um por um, ele relatou casos em que soldados da unidade haviam arruinado suas vidas em Forte Bliss antes do desdobramento para o Iraque no ano passado: quatro suicídios, uma overdose de drogas, um assassinato cometido com um taco de beisebol, um acidente fatal causado por um motorista embriagado, casos de violência doméstica e um tiro após uma discussão em um bar.
Pelo menos seis dos ex-soldados da unidade estão servindo 15 anos ou mais de prisão por esses crimes e outros julgamentos ainda estão pendentes. Como parte de uma faxina da casa, Newell demitiu mais de 150 soldados do Exército e implementou ações disciplinares a mais de 10% da brigada de 3,5 mil soldados. Em uma companhia, 39 dos 150 soldados foram à corte marcial.
O capitão Rolland Johnson, de 26 anos, comandante da companhia, disse que a abordagem da brigada exige que ele preste atenção a seus soldados de maneira que seria impensável há alguns anos.
"Posso te dizer o nome completo e a cidade de todos", disse, acrescentando que recentemente instalou uma caixa de sugestões para seus soldados em uma antiga lata de munições. "Antes, se você visse o capitão se aproximar isso queria dizer que estava em apuros. As coisas mudaram muito, mas também temos um novo tipo de soldado, dado tudo o que viram e o tempo que ficaram fora."
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