14 de janeiro de 2012 • Fernanda Morena
As taxas de suicídio na China estão
entre as mais altas do planeta, conforme dados da Organização Mundial da Saúde.
Em setembro de 2011, o Centro para Controle e Prevenção de Doenças, órgão
governamental chinês, anunciou que 287 mil pessoas tiram a própria vida no país
anualmente, o que equivale a 3,6% das mortes registradas. A faixa etária mais
afetada é a de jovens entre 15 e 34 anos, sendo o suicídio a causa da morte
para 26,04% destes.
Casos
envolvendo tentativas de suicídio são registrados em todos os níveis da
educação chinesa. Um dos mais recentes ocorreu em novembro de 2011, quando uma
estudante de 13 anos morreu após saltar do sexto andar de um prédio.
Investigação
comandada pelo departamento de educação de Luoyang, em Henan, onde a menina
morava, concluiu que ela sofria penalidades físicas na escola quando não fazia
o dever de casa. A professora de matemática forçava alguns alunos, entre eles a
garota, a fazer agachamentos que, por vezes, totalizavam 800 repetições.
O
caso não é isolado. Três semanas antes, no dia 24 de outubro, duas alunas do
ensino fundamental tomaram veneno na sala de aula de uma escola da província de
Anhui. Antes, escreveram no quadro negro: "Se morrermos, a culpa é da
professora de matemática. Chamem a polícia para que a prendam". A apuração
concluiu que a docente teria rido das notas baixas atingidas pelas meninas em
um teste.
Em
setembro, por muito pouco outra história não teve desfecho igualmente trágico.
Uma aluna da 5ª série e duas da 6ª deram as mãos e pularam do segundo andar de
um prédio na província de Jiangxi. O motivo do quase fatal incidente foi o
fracasso das meninas em terminarem uma lição de casa.
Alunos mais velhos, motivos diferentes
Com estudantes mais velhos, a motivação muda. "Para os acima de 18, em geral, as mortes são atribuídas a relacionamentos amorosos ou pressões econômicas", explica Michael Phillips, diretor do Centro de Pesquisa de Métodos de Prevenção de Suicídio de Xangai.
Com estudantes mais velhos, a motivação muda. "Para os acima de 18, em geral, as mortes são atribuídas a relacionamentos amorosos ou pressões econômicas", explica Michael Phillips, diretor do Centro de Pesquisa de Métodos de Prevenção de Suicídio de Xangai.
"Com
a expansão da educação superior na década de 1990, o número de jovens com
diploma universitário cresceu rapidamente, mas o mercado de trabalho não
acompanhou o processo, ficando impossibilitado de absorver tanta mão de obra
qualificada", avalia a professora de Ciências Sociais da Universidade do
Povo Xie Guihua.
E
foi justamente por causa da pressão financeira que Hong Qiankun pulou da janela
do dormitório após receber o título de mestre pela universidade Tsinghua, a
mais prestigiosa do país ao lado da Universidade de Pequim, em 2007. No bilhete
deixado aos pais, dizia: "Seu filho é bom. Não consigo encontrar emprego.
Não quero mais ser um peso". O mesmo ocorreu com Liu Wei, uma estudante de
21 anos da província de Shandong, que tirou a própria vida em 2009 por não
conseguir trabalho para ajudar os pais, camponeses pobres.
A
resposta de Pequim foi promover a migração desses novos trabalhadores para o
interior do país, fazendo-os deixar os grandes centros urbanos, como Xangai e a
capital nacional.
"Como
professora, não consigo perceber por que os estudantes chineses sofreriam mais
pressão do que em outros países", diz Xie Guihua.
Mais de 20% já pensaram em suicídio
Entre 2005 e 2007, a Universidade de Pequim coordenou um estudo com 140 mil estudantes do Ensino Médio na China. Segundo o trabalho, 20,4% disseram já ter pensado em suicídio, e 6,5% teriam inclusive planejado concretamente o ato - tendo já comprado medicamentos ou escrito uma carta à família. Sentimento de pressão escolar e solidão seriam as maiores causas, mas não as únicas. "É muito simplista pensar que suicídios ocorram só em função da escola. Existe uma série de fatores biológicos, sociais e emocionais que contribuem para uma tentativa de tirar a própria vida", avalia Michael Phillips.
Entre 2005 e 2007, a Universidade de Pequim coordenou um estudo com 140 mil estudantes do Ensino Médio na China. Segundo o trabalho, 20,4% disseram já ter pensado em suicídio, e 6,5% teriam inclusive planejado concretamente o ato - tendo já comprado medicamentos ou escrito uma carta à família. Sentimento de pressão escolar e solidão seriam as maiores causas, mas não as únicas. "É muito simplista pensar que suicídios ocorram só em função da escola. Existe uma série de fatores biológicos, sociais e emocionais que contribuem para uma tentativa de tirar a própria vida", avalia Michael Phillips.
Programa de metas
Desde 2009, uma regulação implementada promete punir universidades com mais de 10 casos anuais de suicídio com a perda de pontos na avaliação de qualidade de ensino feita pelo órgão governamental a que são filiadas (como o Ministério da Educação ou o governo provincial). É uma forma de fazer com que os centros de estudos fiquem atentos ao comportamento dos jovens e também mantenham uma política de cobrança mais razoável. "Esses centros estão focando na prevenção do suicídio e na avaliação geral do desempenho dos alunos", aponta Phillips.
Desde 2009, uma regulação implementada promete punir universidades com mais de 10 casos anuais de suicídio com a perda de pontos na avaliação de qualidade de ensino feita pelo órgão governamental a que são filiadas (como o Ministério da Educação ou o governo provincial). É uma forma de fazer com que os centros de estudos fiquem atentos ao comportamento dos jovens e também mantenham uma política de cobrança mais razoável. "Esses centros estão focando na prevenção do suicídio e na avaliação geral do desempenho dos alunos", aponta Phillips.
As
instituições, contudo, não se pronunciam sobre a regra, considerada reflexo de
um aspecto negativo da educação no país, e sequer são divulgados números.
"A fim de controlar esses números, as universidades estabelecem programas
de apoio psicológico aos estudantes e designam 'mentores' a cada turma",
diz a professora Xie Guihua.
Quando
consegue evitar a repercussão, os casos são mantidos em sigilo pelo governo.
Questão histórica
A China tem tradição secular em sistemas de exames. Desde o século 7, burocratas mandarins eram testados na filosofia de Confúcio para conseguirem uma posição de trabalho na corte imperial. Na fase moderna do país, a versão nacional do vestibular voltou a ser instalada em 1978, após a abertura econômica. A essa cultura centenária é atribuído o alto nível de exigência das escolas, somado ao desenvolvimento do ensino no país.
A China tem tradição secular em sistemas de exames. Desde o século 7, burocratas mandarins eram testados na filosofia de Confúcio para conseguirem uma posição de trabalho na corte imperial. Na fase moderna do país, a versão nacional do vestibular voltou a ser instalada em 1978, após a abertura econômica. A essa cultura centenária é atribuído o alto nível de exigência das escolas, somado ao desenvolvimento do ensino no país.
Hoje,
por exemplo, os estudantes são encorajados desde cedo a levarem as lições da
escola para casa para copiar as aulas inúmeras vezes com o objetivo de
memorizar o conteúdo. Não é raro alunos terem de declamar em frente à turma o
que está sendo ensinado.
Na
capital chinesa, onde a carga horária diária é de oito horas e 45% dos alunos
passam mais quatro horas semanais em aulas de reforço, conforme a OCDE, as
escolas têm o direito de expulsar alunos que fracassarem em mais da metade das
matérias por três bimestres consecutivos. "Na Universidade de Pequim, um
aluno pode ser 'convidado a se retirar' se ele repetir cinco matérias",
conta a professora Xie Guihua.
Já
em Xangai, o centro financeiro e econômico da China e que tem o melhor nível de
educação em termos de compreensão textual, ciências e matemática do mundo,
conforme a avaliação trienal do Programa Internacional de Avaliação de Alunos
(Pisa) de 2009, cerca de 90% dos alunos dormem menos de sete horas diárias,
três a menos do que o recomendado pelo Ministério de Educação do país. Em
novembro, o Bureau de Educação do Distrito de Xuhui divulgou uma pesquisa com
20 mil estudantes dos ensinos fundamental e médio da cidade, revelando que 60%
dos entrevistados gastam entre duas e quatro horas diárias fazendo deveres de
casa.
Anualmente,
o país gasta 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) com educação, e 90,4% dos
estudantes dos ensinos fundamental e médio estão matriculados em escolas
públicas. Durante os primeiros cinco anos, os estudos são 100% financiados pelo
governo. A partir do 6º, as famílias pagam uma anuidade, que consome 12,1% da
renda anual familiar, segundo dados do departamento de estatísticas chinês.
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