Suicídio permanece como tabu na imprensa
2 de junho de 2010
De acordo com um levantamento de dados do Sistema de Informações de Mortalidade do DataSUS, do ano de 2008, foram notificados mais de 9 mil casos de suicídios no Brasil naquele ano, o que corresponde a cerca de 25 mortes por dia. Devido a subnotificação de casos de suicídio no país, estima-se que esse número seja 20% maior do que o oficial. No entanto, o assunto permanece como um tabu para a cobertura jornalística em saúde.
Para discutir o tema, o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) promoveu, no dia 25 de maio, o seminário “Suicídio na Imprensa: entre informação, prevenção e omissão”, que contou com a participação de especialistas no assunto e profissionais de imprensa. Como convidados, o editor de Saúde do jornal O Globo, Antônio Marinho; o jornalista e professor da PUC-Rio, Arthur Dapieve; o pesquisador e coordenador do Grupo de pesquisa de prevenção do suicídio do Icict, Carlos Eduardo Estellita-Lins; a editora de Saúde do jornal Extra, Flávia Junqueira e o professor da Unicamp e presidente da Comissão de prevenção do suicídio, da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Neury José Botega.
Umberto Trigueiros, diretor do Icict, abriu a discussão ressaltando a importância do debate sobre o tema para o Instituto. “Temos o ‘Observatório de Saúde na Mídia', que investigou a epidemia de dengue e, hoje pesquisa outros temas. Daqui a um tempo, o suicídio também poderá ser incorporado ao catálogo de informações e assim poderemos trabalhar do ponto de vista acadêmico, de formação e de programas de saúde”.
Autor do livro “Morreu na Contramão”, fruto de sua dissertação de mestrado defendida em 2006 na PUC-RJ, Arthur Dapieve apresentou os dados do seu levantamento sobre as reportagens sobre suicídio publicadas no jornal O Globo no ano de 2004. Segundo o jornalista, das 142 matérias publicadas naquele ano, 60% falava sobre o suicídio de Getúlio Vargas, que completava 50 anos. Outras citações contavam pesquisas sobre depressão, ataques terroristas (“neste tipo de matéria, às vezes, o suicida sequer era contabilizado entre as vítimas”) e quatro menções sobre o suicídio no período da ditadura militar.
Para o jornalista e professor da PUC-RJ, o silêncio sobre o assunto equivale a ‘fechar os olhos’ para uma faceta importante da sociedade. “A imprensa tem preconceito em divulgar notícias sobre suicídio, mas deve-se lembrar que os preconceitos da sociedade também se refletem nas práticas do jornalismo. Acredito que romantizar os suicídios não ajuda muito, mas não noticiá-los é um problema sério. O que devemos buscar é um equilíbrio entre esses dois pilares”.
Contextualização versus silêncio
Antônio Marinho, editor do jornal O Globo de Ciência & Saúde, afirma não se lembrar de ter feito reportagens sobre suicídio. “Há, de fato, um silêncio sobre o tema dentro das redações. Mas ninguém sabe informar ao certo de onde vem essa proibição”. Segundo Marinho, fala-se do assunto quando há um ataque suicida ou um caso de eutanásia, mas não se discute o porquê do ato. “O manual da Organização Mundial de Saúde (OMS), atualmente, é nossa única fonte sobre o assunto. A mídia precisa aprender a discutir o suicídio, pois nunca houve uma tentativa verdadeira”.
O pesquisador e coordenador do Grupo de pesquisa de prevenção do suicídio do Icict, Carlos Eduardo Estellita-Lins, ressaltou a importância das estratégias de prevenção para conhecer os meios de suicídio e realizar o diagnóstico precoce. A divulgação dos meios de se cometer o suicídio e a omissão de fatos são problemas graves que envolvem a questão. “Devemos lembrar que a omissão também é o falar demais, a fala descontextualizada, não somente o silêncio”.
Flávia Junqueira, editora de Saúde do jornal Extra, assim como Antonio Marinho, não se lembra de ter realizado uma cobertura sobre prevenção ao suicídio em mais de uma década de existência do jornal. “Quando existe algum tipo de citação sobre o assunto, geralmente, é nas matérias sobre depressão. Como o Extra é um jornal popular, a linguagem é mais direta, não sabemos ainda como oferecer noções didáticas de prevenção, por exemplo”.
Último a se apresentar, professor da Unicamp e presidente da Comissão de prevenção do suicídio da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Neury José Botega enfatizou que o assunto, além de ser uma tragédia pessoal, é uma tragédia “silenciosa e silenciada”. “Os números ainda são abstratos, devido a subnotificação, e no Brasil, é considerado ‘pequeno’ em escala mundial. Com esse pensamento, o suicídio fica à sombra de outras mortes trágicas, como homicídios e acidentes de trânsito”.
Botega também acredita que a conscientização é o primeiro passo para discutir o assunto e criar estratégias para a prevenção. Para o pesquisador, algumas intervenções podem ser realizadas, como campanhas de conscientização da população em geral e também campanhas voltadas para grupos de risco (pessoas que sofrem de doenças mentais). “O suicídio não é ‘apenas’ um problema de saúde pública. É um problema humano; muitas pessoas que estão sob o risco de cometer o suicídio podem e devem receber ajuda. A sociedade está se abrindo para o assunto, e a imprensa também”.
Fonte: http://www.lappis.org.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1289&sid=1
BoletIn - Integralidade em Saúde
Olá!! Acho preocupante o não aprofundamento em em tema tão emergente em nossa sociedade e em muitos países. Quero colaborar com a discussão apresentando uminha preocupação do suicídio relacionado às condições de trabalho: estou desenvolvendo um estudo de Doutorado onde busco compreende essa relação, pois, para construírmos polícias de prevenção, a relação trabalho e saúde mental não pode ficar fora da pauta. Se alguém se interessar e ou tiver materiais, gostaria de ter contatos. um abraço a todas e todos envolvidos nessa alarmante situação. Professor Márcio Cesar Ferraciolli - Departamento de Psicologia da UFPR- Curitiba -PR - Brasil
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