terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Um exemplo de união profissional em favor da prevenção do suicídio

Há 12 anos rede de profissionais e voluntários atua para prevenção ao suicídio em Adamantina

A psicóloga Ana Vitória Salimon C. dos Santos há 12 anos estuda o assunto e faz parte de grupo que trabalha com a prevenção do problema na cidade e região.

Jornal Impacto (26 jan 2019)

Psicóloga Ana Vitória Salimon (Foto: João Vinícius | Grupo Impacto)

A OMS (Organização Mundial da Saúde) estabeleceu a meta de reduzir em 10% os casos de mortes por suicídio até 2020. No Brasil, os números são preocupantes: de 2007 a 2016, 106.374 pessoas morreram em decorrência do suicídio — em 2016, a taxa foi de 5,8 por 100 mil habitantes, segundo o Ministério da Saúde.

Casos divulgados pelas redes sociais e parte da imprensa nas últimas semanas trouxeram a população de Adamantina sensação que o problema é alarmante, no sentido de que qualquer vida perdida por causa externa, seja homicídio, suicídio, acidente de trânsito ou outra situação, pressupõe a necessidade de reflexões e, quando necessário, ações para evitar novas perdas.

Adamantina não está entre as maiores taxas de mortalidade por suicídio do país, apesar de apresentar taxa considerada média. A informação é da psicóloga Ana Vitória Salimon C. dos Santos, que há 12 anos estuda o assunto e faz parte de grupo que trabalha com a prevenção do problema na cidade e região.

Segundo ela, falar sobre suicídio não é necessariamente um problema, porém depende de como, o quê e para quê se comenta.

“Existem materiais disponíveis na internet da Organização Mundial de Saúde e da Associação Brasileira de Psiquiatria que orientam como a questão deve ser abordada na mídia. Considerando que qualquer pessoa atualmente se coloca em meios de divulgação, as recomendações são válidas para todos, como, por exemplo, não divulgar fotos e imagens de suicídios ou tentativas, não colocar em destaque, nem expor pessoas e família, entre outros cuidados”, explica.

A profissional está a frente do Núcleo de Psicologia da UniFAI (Centro Universitários de Adamantina), é membro e articuladora da Rede Promover Vida e co-fundadora da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio.

“Em Adamantina está sendo feito um trabalho há muito tempo de cuidado e prevenção do suicídio. Isso faz também que se tome conhecimento, as autoridades, destas situações. Não necessariamente Adamantina possui um número elevado. Existem lugares no Brasil, como Mato Grosso e Rio Grande do Sul, em que os números são absurdamente maiores. Mesmo se considerarmos somente o estado de São Paulo, Adamantina, a nossa microrregião, não possui o maior número de casos. Talvez por nossos municípios serem pequenos, e agora com as mídias sociais, existe uma rapidez muito grande em se veicular os casos, as vezes propagado de uma forma inadequada. As pessoas postam fotos, comentários, diria que são inadequadas, pois divulgam um pânico e expõem a pessoa que sofreu, que está em uma condição delicada, e seus familiares”, alerta.

Ana Vitória explica que o suicídio não tem uma explicação simplista, por isso deve se ter cuidado ao propagá-lo.  “Geralmente existem comentários: a pessoa se suicidou por um problema afetivo ou por uma questão financeira. Isso é o que chamamos na área de psicologia e psiquiatria de fator precipitante, o que não quer dizer que é a causa que levou ao suicídio. Existe um conjunto de fatores. O suicídio nunca pode ser visto apenas pela ótica individual. Tem que ser visto de forma complexa”.

Fatores sociais e individuais podem levar ao suicídio. “A gente tem que analisar o sentido da vida e da morte dentro de uma cultura, o que são valores para estas pessoas, avaliar as condições sociais e de vida. O que afeta para a pessoa chegar ao suicídio iremos pensar desde questões maiores, do próprio local em que sevive, política e economia, por exemplo, até questões que se aproximam do individuo, como a cultura, a forma de pensar, família, amigos, relações afetivas, religião, um conjunto de coisas”.

Rede de prevenção ao suicídio

Em 2005, os casos de suicídio em Adamantina, e as tentativas, já incomodavam profissionais da área de saúde, autoridades locais e estudantes do curso de Psicologia da UniFAI. “Naquela época não tínhamos a mínima noção de quantas pessoas e quais eram as características das mesmas”, relembra Ana Vitória.

Dois anos depois, uma sequência de suicídios e tentativas motivou mobilização da Secretaria de Saúde com o Núcleo de Psicologia da UniFAI. “Iniciamos o monitoramento em Adamantina e começamos entender se eram adultos ou crianças, gênero, quantos aconteciam, a partir daí o trabalho foi crescente. Em 2007 realizamos este levantamento. No ano seguinte priorizamos o atendimento psicológico destas pessoas no Núcleo de Psicologia e no Posto de Saúde. Um trabalho que foi se construindo”.

Em 2009, recorda Ana Vitória, o projeto começou a envolver a Psicologia da Santa Casa, o Centro de Atenção Psicossocial, que iniciava suas atividades no Município, e outras instituições, formando uma rede de acolhimento, diagnóstico e intervenções necessários.

“Ao passo que este projeto acontecia chegávamos mais perto das pessoas com comportamento suicida e/ou afetadas por elas, começamos orientar estas famílias. E de lá para cá só fomos aprimorando. Aumentamos a capacidade de atendimento em Psicologia com estagiários do último ano do curso.Fomos nos especializando em atender pessoas em risco”.

A profissional pontua que a princípio objetivavam que o atendimento deveria ser voltado a psicologia e psiquiatria, pensamento comum da população.

“Quando começamos a entender melhor fomos encontrando pessoas em situação de crise, das mais diversas ordens: financeira, afetiva, social. E começamos a ter clareza que não eram a psicologia e psiquiatria sozinhas que resolveriam a questão. Isso não seria prevenção ao suicídio. Tínhamos que promover uma melhor qualidade de vida”.

Para isso, no ano de 2010, foi realizada primeira reunião da Rede Promover Vida. “Quem tentou suicídio não precisará apenas da psicologia e psiquiatria, pode precisar da Secretaria de Esportes, pois necessita de saúde e lazer, talvez seja alguém que precise de atendimento ou benefício da área da Assistência Social, precisa de Cultura, apoio dos estabelecimentos de Educação, entre outras áreas”.

Neste trabalho de promover qualidade de vida e prevenção do suicídio e outras violências foi formada uma rede com diversos eixos, entre elas secretarias municipais de Adamantina, como de Saúde (órgão gestor, Centro de Atenção Psicossocial - CAPS, Programas de Estratégias de Saúde da Família, Agentes Comunitários, Setor de Vigilância Epidemiológica, Unidades Básicas de Saúde, Núcleo de Apoio a Saúde da Família - NASF), de Educação (Psicologia e órgão gestor) e da Assistência Social (órgão gestor, Centro de Referência em Assistência Social - CRAS, Centro de Referência Especializado em Assistência Social - CREAS, Centro de Convivência da Juventude- CCJ); instituição acadêmica: Centro Universitário de Adamantina, com a cooperação de vários cursos, além da Psicologia (dependendo as demandas: Publicidade, Design, Farmácia, Serviço Social, Enfermagem, Medicina, entre outros), Diretoria Regional de Ensino, Pronto-Socorro municipal, Santa Casa de Misericórdia, Corpo de Bombeiros e Conselho Tutelar. Também colaboram com a rede ex-alunos e ex-funcionários dos órgãos citados.

Participam também com frequência das ações representantes da Polícia Civil e Militar, do Centro de Qualidade de Vida e Saúde do Servidor da Região Oeste - Secretaria de Administração Penitenciária (CQVIDASS/Croeste),Tiro de Guerra, técnicos do Poder Judiciário, representantes de organizações não governamentais, profissionais e órgãos de municípios vizinhos, entre outros.

“Trabalhar a questão do suicídio é trabalhar em rede. Prevenir aquilo que deu sinais e promover qualidade de vida. Trabalhamos em conjunto e cada órgão vai criando independência para desenvolver suas próprias ações”, diz Ana Vitória.

Para ampliar as discussões sobre o tema, todo mês de setembro é promovido o ‘Encontro por uma Cultura de Paz de Adamantina: ações de promoção da vida, prevenção do suicídio e outras violências’ e ‘Simpósio Regional de Prevenção e Posvenção do Suicídio’.

“Tratar a questão do suicídio é sair do lugar de falar qualquer coisa, principalmente na questão do julgamento. A nossa ótica é a do cuidado. Se alguém comentou, disse que pensou ou demonstrou um planejamento do suicídio, é necessário atenção. Ela precisa ser ouvida e cuidada. O que está acontecendo com ela precisa ser entendido”, aponta Ana Vitória.

Outra iniciativa para o cuidado foi articulação para instalar em Adamantina um posto do CVV (Centro de Valorização da Vida). “O Posto do CVV presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, respeito e anonimato”, explica. “Não é um atendimento profissional, não substitui atendimentos na área de saúde, quando necessário, mas é um atendimento humanizado, capacitado para prover apoio emocional”.

O atendimento é pelo telefone 188.

Fonte: http://ginoticias.com.br/ha-12-anos-rede-de-profissionais-e-voluntarios-atua-para-prevencao-ao-suicidio-em-adamantina/

Nenhum comentário:

Postar um comentário