sexta-feira, 29 de junho de 2018

Uma notícia que merece aplauso, mas que mostra o atraso da área da saúde na prevenção do suicídio...

Por meio deste blog, há pouco mais de um ano, um médico recém-formado me contactou para solicitar indicação de bibliografia para as ocorrências de crise suicida.

Em resumo, depois de 6 anos de graduação e talvez algum(ns) curso(s) complementar(es) este médico (que representa grande parte dos médicos recém-formados do Brasil) NÃO sabia como lidar, em um caso de emergência, com um paciente em crise suicida.

Neste caso específico, ele fez o que pode, mas não tinha certeza se havia procedido segundo algum protocolo (que ele suspeitava existir).

Recomendei-lhe o clássico Crise suicida: avaliação e manejo, do Neury José Botega, como leitura básica, obrigatória.

Felizmente (a despeito do longo atraso) nos chega esta boa notícia, aí abaixo:

Disciplina inédita na USP de Ribeirão Preto vai capacitar enfermeiros a atuar na prevenção do suicídio

Módulo optativo voltado a alunos de graduação no interior de São Paulo começa a ser ministrado em agosto. Em 6 anos, Brasil registrou 62,8 mil casos de suicídio, aponta Ministério da Saúde.

Universidade de São Paulo acaba de lançar uma nova disciplina sobre prevenção do comportamento suicida na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (SP). Considerada pela instituição como pioneira no Brasil, a iniciativa visa capacitar alunos da graduação a identificar e prevenir situações de risco de suicídio de pacientes e combater o preconceito.

Intitulada de "Introdução à Prevenção e Posvenção do Suicídio", a disciplina optativa começará a ser ministrada em agosto, com previsão de término em novembro. A enfermagem da USP também pretende oferecer cursos e palestras ao público em geral.

A proposta foi apresentada pela professora doutora do curso de enfermagem, Kelly Graziani Giacchero Vedana, após perceber a necessidade de os alunos aprofundarem o conhecimento sobre suicídio e desmistificarem as dificuldades de abordagem enfrentadas no meio profissional.

“Os alunos tinham interesse, porém, com a formação do generalista, a gente passa mais brevemente sobre esses assuntos mais especializados. Também com o fato de que os profissionais de saúde, no geral, têm bastante dificuldade em lidar com o tema, vi que a melhor alternativa seria a de criar uma disciplina”, disse.

Com uma média nacional de 5,5 mortes por 100 mil habitantes, o Brasil registrou entre 2011 e 2016 62.804 ocorrências de suicídio. As situações mais recorrentes envolveram homens - 79% dos casos - e foram concretizadas por enforcamento - 62%. Somente no Estado de São Paulo, no mesmo período, foram 8.585 suicídios.

Além das mortes concretizadas, entre 2011 e 2016 ocorreram em todo país outras 48.204 tentativas, em 69% delas praticadas por mulheres. Um terço das vítimas tentou o suicídio mais de uma vez.

Avaliação de risco

No plano estabelecido para a disciplina em Ribeirão, os alunos terão a oportunidade de desenvolver competências para avaliar o potencial de suicídio, reconhecer fatores de risco e proteção, identificar necessidades de saúde e elaborar ações de cuidado voltadas para o indivíduo e familiares.

Segundo Kelly, a disciplina será útil tanto para a prevenção do suicídio, em casos de risco, quanto em situações de menor potencial.

“Se os profissionais estiverem mais aptos para rastrear esse risco e tiverem um acompanhamento desses casos, provavelmente teremos mais chances de prevenção. Acreditamos que a maioria dos casos de suicídio sejam preveníveis”, completa.

Para a professora, preparar o profissional para identificar os casos também é necessário para que haja a prevenção e o apoio pósvenção, ou seja, a assistência ao paciente depois da tentativa e à família após o suicídio consumado.

“Hoje em dia temos um leque bem variado de profissionais que atuam nessa área da saúde e todos precisam estar preparados para essas situações, porque muitas vezes as pessoas vão expressar pedidos de ajuda que podem não ser muito claros em diferentes setores da comunidade, nem sempre será com esses profissionais da saúde”, analisa.

Desafios

Um dos grandes desafios enfrentados pelos profissionais que lidam com as tentativas de suicídio está ligado ao próprio comportamento e aos sentimentos que podem surgir durante o atendimento ao paciente.

Kelly explica que uma das principais questões é o bloqueio relacionado às emoções, crenças e aos mitos relacionados ao suicídio, porque esse é um tema bastante complexo.

“O suicídio é um os grandes mistérios com que a gente lida na saúde mental. O que se destaca é a dificuldade também de saber avaliar riscos, de identificar alguns padrões, mas também saber reconhecer a individualidade dos casos, porque isso é bem desafiador”, comenta.

Com a disciplina específica, a professora acredita que o conhecimento adquirido pelos alunos da enfermagem será expandido para outras regiões do país.

“Nossos alunos vão para várias regiões do país e, muitas vezes, numa posição de poder modificar a política, as ações e várias questões de serviço de saúde. Temos a intenção, tanto na disciplina, quanto por meio de outras ações é tornar os alunos multiplicadores, acreditamos que isso pode ter um efeito positivo sobre várias pessoas que nem conhecemos,”, completa Kelly.

Fonte: https://g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/disciplina-inedita-na-usp-de-ribeirao-preto-vai-capacitar-enfermeiros-a-atuar-na-prevencao-do-suicidio.ghtml

terça-feira, 19 de junho de 2018

Matéria de Eliane Brum sobre o suicídio de adolescentes

O suicídio dos que não viram adultos nesse mundo corroído

Por que, neste século, mais adolescentes têm respondido ao desespero deletando a própria vida?

Eliane Brum
18/6/2018

Desde que dois alunos do Colégio Bandeirantes, tradicional escola de elite de São Paulo, se mataram no espaço de 15 dias no mês de abril, o suicídio de adolescentes entrou no debate público no Brasil. Psicanalistas e profissionais de saúde mental têm sido chamados à rede privada de ensino para falar sobre o tema. Pais e professores estão em busca de pistas para compreender por que mais jovens tiram a própria vida e como é possível prevenir a tragédia. Casos de adolescentes que se matam já fazem parte da crônica das cidades de todos os tamanhos no país, do Rio Grande do Sul aos estados da Amazônia. No Brasil, entre 2000 a 2015, os suicídios aumentaram 65% dos 10 aos 14 anos e 45% dos 15 aos 19 anos, segundo levantamento do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador do Mapa da Violência no Brasil. Nos últimos dois anos, os números podem indicar uma pequena estabilização, mas só daqui mais um ano será possível afirmar se é uma tendência ou apenas uma oscilação. No mundo, o suicídio já é a segunda causa de morte entre adolescentes, segundo a Organização Mundial da Saúde. Por que mais jovens se suicidam hoje do que ontem?

Essa é a pergunta óbvia de onde costuma partir o debate. Mas a pergunta ainda mais óbvia talvez seja: por que não haveria mais adolescentes interrompendo a própria vida nos dias atuais do que no passado? Na leitura do momento, me parece que o espanto se justificaria se, num mundo distópico, houvesse menos jovens com dificuldade de encontrar sentidos diante do desespero.

A inversão da pergunta não é um jogo retórico. Ela é decisiva. É decisiva também porque devolve a política à pergunta, de onde ela nunca poderia ter saído. E a recoloca no campo do coletivo.

Essa dimensão não apaga a singularidade de cada caso, mas é necessário situar essa singularidade no contexto do seu tempo histórico. Quando adolescentes se matam, eles dizem algo sobre si mesmos, mas também dizem algo sobre a época em que não viverão. É esse o ângulo que me parece importante chamar a atenção, porque em geral ele é apagado. É nas particularidades de cada história que podemos encontrar caminhos para prevenir o ato de desespero, mas é também na conformação do mundo em que a violência autoinfligida ocorre que devemos buscar pistas para compreender o que o suicídio expressa sobre essa época.

Os adolescentes de hoje herdarão um mundo corroído pela mudança climática provocada pelas gerações anteriores, incluindo a de seus pais, onde a água vem se tornando o grande desafio e a paisagem já começa a ser desfigurada. As séries de TV, principal produto cultural e também de entretenimento, expressam o sentimento dessa época: um presente que já é uma distopia e a impossibilidade de imaginar um futuro que não seja apocalíptico. A internet, onde os adolescentes e a maioria dos adultos vive, arrancou a ilusão sobre o que chamamos de humanidade. Ao permitir que cada um se mostrasse sem máscaras, que cada um pudesse “dizer tudo”, abriu-se uma ferida narcísica cujos impactos levaremos muito tempo para dimensionar. Essa ilusão sobre o quê e quem somos nós cumpria um papel importante no pacto civilizatório. Sua perda é parte da explicação da dificuldade de compartilhar o espaço público, hoje interditado por ódios.

Por que, diante desse cenário, mais adolescentes não teriam dificuldade para encontrar saídas? Por que alguém que está vivendo uma fase da vida em que precisa dar conta de um corpo em transformação e assumir a responsabilidade de encontrar seu lugar não estaria desorientado diante do mundo que o espera – ou mesmo sem nenhuma confiança de que vale a pena ser adulto nesse planeta?

Se cada caso é um caso, o significado de ser adolescente nessa época determinada não pode ser deletado de qualquer resposta que pretenda ser uma resposta. Aberta, em constante construção, mas uma resposta.

Um adolescente que faz perguntas duras a si mesmo e aos adultos não está apresentando um comportamento desviante. São perguntas inteligentes, são perguntas de quem percebe o mundo que vive, são perguntas de quem se recusa a se alienar. O desafio que o suicídio nos apresenta, como sociedade, é conseguir construir junto com os jovens uma resposta que não seja a brutalidade de tirar a própria vida.

Essa tarefa não é individual, não é um problema apenas do adolescente que não consegue encontrar sentido ou de sua família. Mas uma construção coletiva. Inclui esse adolescente, mas não é só dele. Se há uma possibilidade nesse momento é a de que o desespero de ver adolescentes morrendo fez com que se rompesse o silêncio sobre o suicídio.

A crença de que falar sobre o suicídio aumenta o número de casos estabeleceu um silêncio em torno das mortes que colaborou para que se localizasse o problema e a suposta solução no indivíduo. Colaborou para a ideia sem substância do suicídio como covardia do adolescente e fracasso dos pais. O suicídio, convenientemente, deixou de ser uma questão da sociedade para ser um problema de uma pessoa ou família com um tipo de defeito. Ou foi colocado na conta de uma patologia mental, com vários nomes disponíveis no mercado. É um fato que há casos de suicídio relacionados a doenças mentais, mas não é possível desconectar qualquer doença da época em que ela é produzida.

A questão não é a doença mental, quando ela existe, ou a angústia e o desespero, mas por que o suicídio tem sido a resposta e não outra a acontecimentos como a doença mental, a angústia e o desespero. É no fato de que ao longo das diversas épocas já houve outras respostas possíveis, outras respostas compatíveis com seguir vivendo, que podemos construir reflexões que nos arranquem da repetição que acaba tratando como problema exclusivamente individual o que é também produção social.

Voltar a falar de suicídio é importante, mas é igualmente importante “como” falar sobre suicídio. Se a questão for apenas estabelecer manuais, como se houvesse uma lista de alarmes para identificar aquele que se descola da manada, ou se a saída encontrada for reforçar a causa e a solução no indivíduo, é só mais um reforço para a tragédia da nossa crescente dificuldade de fazer comunidade. Em resumo: não dá para viver num mundo literalmente corroído e subjetivamente corroído e dizer que o desvio é de quem sofre com ele e não encontra outra saída que não seja o suicídio. Ou da família que não pôde ou não soube como impedir que o adolescente tirasse a própria vida.

Se podemos fazer algo com a tragédia que é termos criado um mundo onde um número maior de adolescentes não se tornará adulto, é reaprendermos a viver em comunidade, redescobrirmos como tecer redes de cuidado mútuo. Isso não tira a responsabilidade individual. Ao contrário, a aumenta. Mas coloca a responsabilidade individual onde ela deve estar: fazendo “laço” com os outros. Fazendo junto.

A primeira geração formada nas redes sociais a partir de “likes” and “blocks”

Não se pode esquecer ainda e principalmente que a marca de se tornar adolescente neste século é a marca de tecer sua experiência na internet. A geração atual é a primeira formada a partir de “likes” and “blocks”, carinhas sorridentes e carinhas furiosas. Ao mesmo tempo que experimenta a possibilidade de deletar o quê ou quem perturba, enfrenta a impossibilidade de deletar seus vestígios para sempre.

Estrear na vida e já ser condenado à memória eterna. Ser formado na impaciência dos segundos e na sobreposição dos tempos. Acreditar que um vídeo de mais de dois minutos ou um texto de mais de dois parágrafos são longos demais. Arriscar-se nas redes sem os limites do corpo, podendo ser algo num minuto e outra coisa inteiramente diferente no minuto seguinte. Mas, ao mesmo tempo, sentir os efeitos profundos dos estímulos digitais no corpo. Os dias acelerados que se emendam e a fábrica de ansiedade. A impossibilidade da desconexão. A vida editada e “feliz” de todos, enquanto dentro de você a tristeza é vivida como fracasso num mundo de tantos bem sucedidos de Facebook, sem saber quem ou o quê é real ou “fake”.

Num vídeo postado dias atrás pelo Channel 4 News, Jaron Lanier, filósofo da internet e criador da realidade virtual, sugere que os adolescentes deveriam abandonar as redes sociais por pelo menos algum tempo. “Somos fisgados por um esquema de recompensas e punições, em que as recompensas acontecem quando você é retuitado por outros e as punições quando você é maltratado por outros nas redes”, diz. Essa manipulação, segundo Lanier, não é tão dramática quanto o vício em heroína ou o vício em jogo, mas obedece ao mesmo princípio. “Deixa as pessoas ansiosas e irritadas, e torna especialmente os adolescentes depressivos, o que pode ser muito grave”, afirma. “Há uma grande quantidade de evidências e estudos científicos. O exemplo mais assustador é a correlação entre o aumento do suicídio entre adolescentes e o aumento do uso das redes sociais.”

Jaron Lanier dá um conselho aos adolescentes: “Se você é uma pessoa jovem e você só vive nas redes sociais, o primeiro dever com você mesmo é conhecer você mesmo. Você deve experimentar viajar, você deve se desafiar. Você não vai se conhecer sem essa perspectiva. Então, dê a você mesmo pelo menos seis meses sem redes sociais. Eu não posso dizer a você o que é o certo. Você tem que decidir”.

Netflix, cinema e a vida depois da perda

No ano passado, o psicanalista Mário Corso foi convidado para dar uma palestra aos alunos de uma escola pública do interior do Rio Grande do Sul. A diferença é que ele não foi convidado pela direção da escola ou pelos professores ou mesmo pelos pais. A iniciativa foi dos alunos. Eles tinham identificado uma colega com ideias de suicídio e decidiram formar uma rede de cuidado. “Os colegas estão mais próximos e sabem melhor do que ninguém quando algo realmente sério está acontecendo”, diz Corso. “Essa experiência de ajudar a combater o mal-estar na escola, de entender as dificuldades da socialização, seria uma formação extra e muito proveitosa que a escola pode dar aos adolescentes. Existem muitos adolescentes cuidadores. É preciso fazer uma aliança com eles.”

Todo profissional que trabalha com saúde mental é marcado pela perda de pacientes. É algo que se carrega pela vida, mas que em geral é elaborado e vivido no espaço privado. A diferença é que Corso ficou assinalado também na esfera pública. Em 2006, um de seus pacientes, Vinicius Gageiro Marques, de 16 anos, transmitiu a própria morte pela internet e teve ajuda de pessoas de diferentes países para consumá-la. A incitação ao suicídio é um crime previsto no Código Penal do Brasil.

Mais de um ano depois do suicídio de seu jovem paciente, Corso me deu uma entrevista que se tornou uma referência, pela profundidade e honestidade com que falou do que viveu. A morte do adolescente teve repercussão internacional e marcou um momento em que as pessoas perceberam que, com a internet, os jovens frequentavam mundos que pais e professores não alcançavam. No segundo semestre, será lançado o filme Yonlu, nome com que Vinicius se apresentava nas redes e assinava a sua produção artística, dirigido por Hique Montanari.

Mário Corso é autor de vários livros, inclusive um infantil. Três deles, escritos junto com a também psicanalista Diana Corso, relacionam produção cultural e psicanálise, dos contos de fadas às atuais séries de TV. O mais recente é Adolescência em Cartaz – filmes e psicanálise para entendê-la (Artmed, 2017). Fiz cinco perguntas a ele:

P: Você acha que o sofrimento que provoca o suicídio hoje, na era da internet, é diferente do sofrimento que provocava o suicídio nos adolescentes de gerações anteriores?

R: Creio que o sofrimento dos adolescentes é o mesmo. Uma solidão imensa, uma sensação de inadequação, uma desesperança próxima ao desespero. A ideia que não há lugar no mundo para si, um mundo complexo demais para ser decodificado, aliado ao momento de fragilidade dos laços entre os pares, é um cruzamento perigoso e doloroso. O que mudou foram as possibilidades de comunicação. Para o bem e para o mal. Por exemplo, o bullying antes era restrito a um lugar, ficava na escola. Hoje ele não para, não dá trégua e não dá àquele que sofre o direito de recomeçar. A internet não esquece.

Estar marcado em um colégio, por uma experiência negativa, antes podia ser solucionado trocando de escola. Hoje, você leva contigo aquilo que gostaria de esquecer. Uma pesquisa rápida e tua ficha é entregue. Por um lado, a rede pode até ajudar os mais fóbicos, pois ela permite ensaiar-se em um ambiente onde o corpo não está em jogo, e propicia a pessoas de hábitos diferentes encontrarem sua praia. Por outro, ela também tem seu lado obscuro: permite que portadores de sofrimentos e patologias, que antes eram isoladas, como a anorexia, se apoiem em parceiros, igualmente tomados na loucura, que incentivam seguir dentro da doença e dão a ela um sentido de pertença, de identidade, muitas vezes letal. O mesmo com o suicídio. Antes isolado, o adolescente tinha menos recursos, até, digamos, técnicos, para saber como se matar. Raramente ele iria encontrar pessoas tão ou mais perturbadas para trocar ideias sobre as "vantagens" do suicídio. Na rede, seguem existindo fóruns de proselitismo do suicídio.

P: O que a morte de Yonlu mudou na sua clínica ou no seu modo de entender o suicídio?

R: Não houve mudanças significativas na clínica ou no entendimento das razões do suicídio. A principal mudança foi em mim. Desci mais um degrau da minha personalidade já melancólica. Já tinha perdido pacientes, mas casos graves, adultos vindos de anos de depressões crônicas, dos quais, entre idas e vindas, eu fui apenas mais uma tentativa fracassada. São perdas distintas. Sendo nesse caso alguém tão jovem, talentoso, inteligente, é difícil se apaziguar. Os psicoterapeutas elaboram pouco sobre os efeitos de serem depositários e testemunhas de tanto sofrimento. Mas são cicatrizes incuráveis. Talvez um dia eu consiga entender melhor tudo isso. Ainda lateja.

P: Desde aquela época, mais de uma década atrás, a sua postura era de que era necessário falar sobre o suicídio. Mas só agora, e em grande parte por conta de séries como 13 Reasons Why (“Os 13 porquês”, Netflix), o silenciamento sobre o suicídio entre adolescentes começa a ser rompido. Por que é importante falar e o que você gostaria de dizer?

R: Falar sobre o problema já é um começo. É um assunto tabu, ninguém se sente à vontade para dar a partida. Ninguém sabe bem o que dizer. O que está em jogo é o sentido da vida. E quem sabe dizer por que a vida vale a pena? Não sabemos dizer até porque é uma questão mal colocada. Não existe resposta racional. A resposta é emocional. Vivemos não por razões, mas por pertencer a uma rede afetiva, por ter uma sociedade que nos dá um lugar. Estamos aqui porque alguém um dia quis assim e ficou inscrito em nós essa marca. A vontade de viver é algo que os pais transmitem, ou não, sem dar-se conta. Mas é um território imponderável, nebuloso.

Acredito que estamos no momento de construir algo novo. Creio que a arte já começou. O seriado da Netflix foi um bom começo. Antes de ele ser feito, eu não acreditaria que daria certo. Tomado pelo paradigma de Werther, de que narrar o suicídio emularia outros, eu não faria. (No século 18, após a publicação do livro Os sofrimentos do Jovem Werther, do escritor alemão Goethe, teria havido uma onda de suicídios de jovens na Europa que foi considerada efeito do romance.) A Netflix fez, e a resposta foi oposta: mais gente falando no assunto e pedindo ajuda.

P: O que você, que analisa a produção cultural pelo viés da psicanálise, acha da série?

R: Ela tem uma grande sacada: eles criaram um herói romântico aparentemente típico. Hannah, a personagem, é uma alma sofrida e sensível, que passou por traumas e é incompreendida. O mundo não seria bom o suficiente para ela. Mas, no decorrer da série, ela se comporta de forma tão pouco empática ao sofrimento dos outros, ela é tão autocentrada e egoísta, que ninguém quer ser como ela. Ela exige cuidado e uma delicadeza que ela mesmo não tem com ninguém. Ela é cega à dor alheia. Ou seja, eles viraram o fio. Ninguém vai querer ser a Hannah mesmo que admitamos que ela tem suas razões e seu sofrimento. Ela ajuda a narra a dor e a vontade de ir embora, mas não desperta identificações diretas. Se um estúdio de TV inventou uma narrativa que faz falar sem estimular o ato, por que a comunidade de quem trabalha com saúde mental não conseguiria? Nós temos é que nos botar a pensar. É um tempo de inventar. Creio que é um desafio que temos que nos colocar. É preciso dar uma visibilidade ao problema real que o suicídio é. Não noticiar os casos, mas encontrar uma nova via de ele estar sempre em pauta.

P: Existiria algo na educação dada atualmente às crianças e aos adolescentes que os deixariam mais vulneráveis?

Corso: É algo que se pensa pouco. Nós temos uma conquista civilizatória interessante, que é a infância protegida, reconhecida em suas particularidades. Não devemos mudar isso, mas talvez pensá-la melhor. Nossas crianças crescem numa bolha de proteção que rompe na adolescência. Abruptamente, descobrem a dureza do mundo, a violência, a exigência desmedida – nesse caso, às vezes dos pais. Sentem-se traídos pelo mundo de conto de fadas que receberam. Será que não exageramos, que não haveria um modo de desde mais cedo mostrar o mundo como o mundo realmente é? Existe uma depressão típica do começo da adolescência que diz respeito ao dar-se conta do peso do mal-estar da civilização. Utopias já não colam, vivemos na época das distopias, crenças religiosas tampouco, o jovem sente que está em um mundo absurdo. E precisamos pensar que ele não desenvolveu os anticorpos que nós já temos... Isso chega de modo à vista. Será não poderia ser em suaves prestações? Brinco, mas creio que exageramos na dose do mundo Disney. Em resumo: não os preparamos para o infortúnio, não discursamos sobre as derrotas, as perdas, e elas são a única certeza nessa vida. Ensinamos a ganhar, a dizer que serão vencedores. Ensinamos o fácil e esquecemos o essencial: saber suportar as rudezas de um momento civilizatório complicado.

O presente só é possível se o futuro for possível

No início dessa coluna, eu propus mudar a pergunta. Não “por que mais adolescentes estão se matando hoje” – e, sim, “por que não haveria ainda mais adolescentes morrendo hoje”. Minha interrogação parte da realidade de um planeta corroído e abandonado pelas utopias. A esse cenário se soma a profunda crise da democracia como sistema capaz de melhorar a vida das pessoas. “Terra arrasada” não é mais uma figura de linguagem, mas uma literalidade. Na dificuldade de enxergar um futuro próximo, quase nos assemelhamos aos marinheiros do passado, que acreditavam que o mundo acabava num barranco, de repente.

Sem perspectiva, sonho, imaginação, desejo, a percepção já é de vida interrompida. Tragado pelos dias de um presente acelerado, em que o corpo é atingido por estímulos 24 horas por 7 dias na semana, mas não tem nem espaço nem tempo para elaborar nenhuma experiência porque logo vem outra por cima, a sensação é de afogamento. Sem perspectiva de futuro, o presente é vórtex.

Sugiro então uma terceira interrogação para esse momento: o que podemos fazer junto com os adolescentes, porque não acredito em juventude sem responsabilização, para que volte a valer a pena viver nesse mundo? Ou como podemos construir juntos uma ideia de futuro que não seja uma distopia? A impossibilidade de imaginar um futuro possível tem impactos profundos sobre a vida de todos, muito mais do que a maioria consegue dimensionar no cotidiano. Recuperar a capacidade de imaginar um mundo onde se possa viver é o imperativo que atravessa essa época. Imaginar a partir da realidade brutal – e não negando-a, como a maioria tem feito.

Esse momento de rompimento do silêncio sobre o suicídio é rico de possibilidades. Mas apenas se formos capazes de recolocar a questão no campo da política. É nisso que as escolas deveriam apostar, assim como todos os espaços de compartilhamento. O desafio, tanto na rede pública quanto na privada, é o de fazer comunidade, inclusive e principalmente entre as redes. Não é porque se chama de “comunidade escolar” que é uma comunidade escolar. Comunidade é algo bem mais profundo e demanda esforço contínuo de fazer laços com o fora e com o dentro, reconhecendo as fronteiras para poder ultrapassá-las.

Será uma pena se esse despertar violento, despertar sobre corpos de alunos mortos, seja desperdiçado pela visão estreita de olhar para o acontecimento como se ele fosse desconectado de sua época, individualizado e isolado. Ou colocar questões de saúde mental como se elas pertencessem a um arquivo impermeável, que não se comunicasse com todos os outros. Os sintomas de nosso tempo expressam onde estão os nossos buracos. Os mais sensíveis sentem primeiro.

Criar uma resposta para o suicídio de adolescentes é também criar uma resposta para a nossa vida nesse planeta. É enfrentar o tema da mudança climática e de sua adaptação a ela, é enfrentar a responsabilidade da nossa espécie com todas as outras cuja casa destruímos, é enfrentar a crise da democracia e criar maneiras de fortalecê-la, para que ela volte a significar possibilidade de combater as desigualdades e fortalecer os direitos.

O mal-estar do nosso tempo, este que tanto afeta aqueles que estão estreando na vida, é alimentado pela nossa impossibilidade de enxergar uma vida possível logo ali na frente. Como os adultos também não enxergam, o desamparo é total. Se um colégio ou qualquer outra instituição quiser de fato enfrentar o suicídio entre adolescentes deve se dedicar também a construir com eles uma ideia de futuro que não seja o apocalipse climático – ou nuclear. Ser parte dessa criação de futuro, mesmo na extrema desesperança do presente, é fazer laço com a vida ao fazer laço com os vivos. O suicídio é também a impossibilidade de fazer parte.

Sem imaginar um futuro possível, não há presente possível. É isso que todos nós precisamos compreender. É isso que os jovens corpos tombados estão também dizendo em seu silenciamento violento. Só se combate a vontade de morrer criando um mundo em que vale a pena viver. Essa é a principal tarefa da escola e de todas as instituições.

Na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), de 2014, o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro disse uma frase provocadora, no melhor sentido: “Os índios entendem de fim de mundo porque já viveram o fim do mundo em 1500”. Retomo essa afirmação para lembrar que os jovens indígenas Guarani-Kaiowá, as novas gerações de um dos povos originários mais massacrados do planeta, se suicidam desde os anos 80. Seu suicídio invisível para os brancos, invisíveis como eles mesmos, tem contado uma narrativa do fim do mundo. É para eles, para esta dor, que deveríamos estar olhando, para este mundo que lá se corrompeu antes pela força do extermínio.

Para os Guarani-Kaiowá, palavra é “palavra que age”. Responder ao suicídio dos adolescentes com vida é romper as barreiras do isolamento e se tornar palavra que age para fazer futuro.

Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas. Site: desacontecimentos.com Email: elianebrum.coluna@gmail.com Twitter: @brumelianebrum/ Facebook: @brumelianebrum

Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/06/18/opinion/1529328111_109277.html

sábado, 16 de junho de 2018

Suicídio no Ceará: importantes reflexões!

Prevenção do suicídio exige quebra de tabus e rede de saúde preparada

De 2011 a 2016, Ceará registrou 3.374 casos de suicídio. Segundo a OMS, 90% estão relacionados a transtornos mentais não tratados

Vanessa Madeira - 16.06.2018

Por muito tempo, acreditou-se que a melhor maneira de lidar com o suicídio era calando. Não falar sobre, não registrar, não noticiar, não discutir. Mas, como forma de prevenção, o silêncio mostrou-se quase tão ineficaz quanto abordagens equivocadas. Indo na contramão, serviu para dar força a um tabu que até hoje dificulta a busca por ajuda e a construção de uma rede capaz de dar assistência a pessoas que necessitam de apoio.

Mesmo com a subnotificação - outro reflexo dos estigmas que cercam o tema - o Ceará, assim como o restante do País, vivencia o crescimento do número de casos de suicídio. Entre 2011 e 2016, de acordo com dados do Ministério da Saúde, 3.374 pessoas tiraram a própria vida no Estado, uma média de 562 por ano e 46 por mês. Segundo relatórios da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 90% dos registros estão relacionados a transtornos mentais não tratadas, que vão desde a depressão à bipolaridade. Logo, com o auxílio adequado, os casos poderiam ter sido prevenidos.

"Vivemos em uma sociedade que está adoecida. Hoje não se fala apenas em câncer, AIDS, mas também em depressão, síndrome de pânico, transtornos mentais que muitas vezes levam ao suicídio. As pessoas estão tomadas de problemas devido às pressões que sofrem e não conseguem ver uma saída, então acabam encontrando no suicídio uma solução", explica Rejane Felipe, coordenadora geral do Centro de Valorização da Vida (CVV) em Fortaleza.

A criação, ainda que tardia, de campanhas como o Setembro Amarelo, que tem como foco a conscientização sobre a prevenção do suicídio, abriu espaço para que os debates em torno do tema se tornassem mais públicos e recorrentes. No entanto, conforme explica Rejane, aspectos culturais e religiosos ainda fortalecem estigmas.

Preconceito

"Ainda é uma epidemia silenciosa. Pessoas que se encontram com algum tipo de transtorno sofrem preconceito e a própria família silencia em relação a isso. Esse preconceito faz com que não procurem ajuda profissional. É como se silenciar a situação fizesse com que ela não existisse. Por mais que se converse, que se procure abrir espaços para discutir, o suicídio ainda é coberto de tabus", completa a coordenadora do CVV.

A organização, cujo objetivo é fornecer apoio emocional a pessoas com tendência ao suicídio, realiza, hoje, cerca de 200 atendimentos por dia. Por meio do ramal 188, voluntários conversam e auxiliam aqueles que procuram ajuda. O trabalho, contudo, tem limitações. Dependendo do caso, faz-se necessária a busca por serviços ou profissionais que ofereçam tratamento.


Rede

É aí surge o segundo impasse: o despreparo da rede de saúde para identificar, diagnosticar e tratar transtornos mentais. O promotor de Justiça Hugo Mendonça, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), afirma que a situação é "digna de extrema preocupação". Também organizador do projeto Vidas Preservadas, que promove capacitações de profissionais para a prevenção do suicídio em parceria com a Secretaria de Saúde do Estado (Sesa), ele ressalta a carência de Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e de leitos psiquiátricos suficientes para atender à demanda crescente.

De acordo com dados da Sesa, apenas 97 dos 184 municípios cearenses possuem Caps implantados. Ao todo, são 136 equipamentos. Fora estes, são disponibilizados 550 leitos psiquiátricos em hospitais especializados e 79 em hospitais gerais.

"Hoje, não temos o mínimo. O único hospital de saúde mental é o de Messejana, então qualquer pessoa que precise de internação tem que ser enviada para lá, onde existem imensas limitações de vagas", avalia Mendonça. "Vários pontos de atenção, com unidades de internação, leitos em hospitais gerais e CAPs, foram pactuados anos atrás, mas até hoje não existem", diz.

O promotor ressalta que, além da quebra dos tabus em torno do suicídio, a rede de atenção precisa ser fortalecida para prevenir casos. Para isso, ele afirma que a sensibilização de gestores e a criação de políticas públicas são urgentes. "É possível prevenir. Mas para isso precisamos quebrar tabus, capacitar pessoas para saber identificar quem são as pessoas com ideias suicidas, como abordar e como encaminhar", acrescenta Mendonça. A supervisora do Núcleo de Atenção à Saúde Mental (Nusam) da Sesa, Aline Teles, observa que o atendimento a pessoas com risco de suicídio não está restrito à Rede de Atenção Psicossocial, em especial os CAPs, estendendo-se aos demais serviços de saúde, como atenção primária, ambulatórios, e urgência e emergência. A rede de assistência social e a rede escolar também estão inclusas, diz Aline.

Capacitação

Segundo a supervisora, a Sesa está "direcionando sua ação no sentido de qualificar as ações nas unidades de saúde para a identificação, manejo e posterior encaminhamento dos casos, quando necessário". "Também estamos estimulando a estratégia de matriciamento para que estas unidades tenham o devido suporte e apoio técnico da equipe especializada em Saúde Mental. Os encontros para discussão e direcionamento das condutas ocorrem pelo menos uma vez ao mês de forma a auxiliar a prática dos casos mais difíceis", explicou Aline.

A representante da Sesa cita, ainda, a parceria com o MPCE, por meio do projeto Vidas Preservadas, com a Secretaria de Educação do Estado (Seduc) e com a Universidade Estadual do Ceará (Uece) para o desenvolvimento de ações de conscientização e capacitação acerca do tema junto a estudantes da rede pública e a profissionais da Saúde.

Fonte: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/cidade/prevencao-do-suicidio-exige-quebra-de-tabus-e-rede-de-saude-preparada-1.1955813

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Como falar sobre suicídio

Suicídio: como falar sobre o ato sem promovê-lo

Lais Modelli, 26 abril 2017

As buscas pela palavra "suicídio" no Google aumentaram 100% no Brasil na terceira semana de abril, na comparação com o mesmo período de 2015. A empresa também registrou aumento repentino na procura por expressões como "suicídio indolor" e "suicídio rápido".

Neste mesmo mês, que marcou o lançamento no país da série 13 Reasons Why - produção da Netflix sobre uma adolescente que registra em áudio os motivos que a levaram a se suicidar -, houve um boom nas buscas por imagens relacionadas a suicídio.

Abril também trouxe notícias sobre suicídios consumados e tentados em diferentes Estados do país, como Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Paraíba. Em alguns casos, a polícia investiga possível relação com um jogo virtual chamado Baleia Azul, que estaria induzindo adolescentes a automutilações e ao suicídio.

Os casos reacenderam a discussão sobre como tratar temas polêmicos sem incentivar imitações no mundo real, o chamado "efeito Werther", referência a um livro do século 18 que desencadeou uma onda de suicídios na Europa.

Falar sem promover

Para a psicóloga Karen Scavacini, coordenadora do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio, não falar sobre suicídio pode ter um efeito tão devastador quanto falar de maneira inadequada.

"Quanto maior o silêncio e segredo em torno de um assunto tabu, pior para quem lida com ele. Poder falar e contar a história pode ter um efeito curativo em quem lê e em quem escreve", defende Karen.

Autora de Mentes Depressivas - As Três Dimensões da Doença do Século (editora Globo), a psiquiatra Ana Beatriz Silva menciona a onda de suicídios atribuída ao lançamento do livro Os Sofrimentos do Jovem Werther, obra de Goethe de 1774 em que o protagonista se mata após um amor não correspondido.

Como reação, o livro foi recolhido e proibiu-se a discussão sobre o suicídio por acreditar que seria algo que incitasse a prática.

"Estima-se que 90% dos suicídios poderiam ser prevenidos. Isso faz pensar que esse preconceito histórico em falar sobre suicídio não ajudou a prevenir essas mortes", diz Silva, citando estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS).

Silva avalia que os padrões da mídia ao relatar casos de suicídio também não contribuem para resolver esse problema social.

"Só falamos em suicídio quando um famoso se mata. Não se pode glamorizar um suicídio, transformar o suicida em herói. Um suicídio é um ato de desespero", diz ela, para quem relatar a trajetória de sofrimento da pessoa é mais relevante do que informar, por exemplo, métodos empregados no ato.

Para Scavacini, do Instituto Vita Alere, apresentar alternativas e divulgar locais ou formas de se obter ajuda é outro meio de falar de suicídio com maior atenção à prevenção.

"Se o relato indica ao final onde a pessoa pode receber ajuda, isso se transforma numa rede de cuidado. Muitas pessoas estão tão perdidas e impactadas que mesmo uma sugestão de caminho a seguir faz grande diferença", orienta.

Catarse coletiva

Para a professora de Comunicação da Universidade Federal Fluminense Renata Rezende, o excesso de referências sobre suicídio, com aumento repentino na circulação de relatos na internet, é exemplo de uma "catarse coletiva": impacto amplificado, nas redes sociais, de assuntos e práticas que são objeto de tabu.

São assuntos, diz ela, geralmente ligados à esfera do segredo, do proibido e que, por isso, despertam a curiosidade.

Rezende afirma que o aumento do interesse pelo suicídio não significa que a prática esteja sendo mais estudada. Pode ser, por exemplo, que a tendência seja apenas um desabafo de pessoas tocadas de algum modo pelo assunto.

Daí, diz a professora, a importância de observar como essas catarses se manifestam.

"Muitas vezes, na falta de conversar com um amigo ou procurar tratamento psicológico, o usuário faz sua catarse no espaço que tem: seu perfil nas redes sociais", afirma.

Algo semelhante, considera Rezende, ocorre com a relação com a morte. "Com as redes sociais, as pessoas começaram a falar mais sobre morte, a fazer memoriais digitais para amigos e parentes, falar das suas dores", diz.

'Gatilhos'

Para a psicoterapeuta Alessandra Ramasine, voluntária há sete anos do Centro de Valorização da Vida (CVV), serviço de apoio emocional e prevenção do suicídio, usar as redes sociais como "mural" de desabafos nem sempre é uma boa ideia, seja para quem relata ou lê.

"Para relatos de experiências, especialmente as doloridas e violentas, é necessário um ambiente seguro, de acolhimento para dores e memórias", afirma Ramasine. "Do mesmo modo, esses relatos causarão impactos e consequências que nem sempre poderão ser administradas individualmente."

Impactos negativos em quem lê, ouve ou assiste a reproduções de violência, sexo ou morte, desencadeando fortes processos emocionais complexos, são chamados de "gatilhos".

"Uma cena de suicídio pode causar muitos impactos na vida de um jovem por meio do gatilho, especialmente quando esses jovens estão fragilizados, angustiados e perdidos nas questões cotidianas, sem apoio e orientação, desconectados com a vida", afirma Ramasine.

Segundo ela, jovens que enfrentam falta de oportunidades de desenvolver um projeto de vida, de planejar o futuro e construir identidade por meio de autoconhecimento, autoestima e autoconfiança podem ser os mais afetados.

Nesse sentido, a psicoterapeuta diz ver aspectos positivos e negativos na série da Netflix sobre suicídio. É útil ao lançar um alerta sobre o problema a pais, professores e amigos, mas prejudicial ao retratar o ato de forma extremamente realista.

Renata Rezende, da UFF, sugere que quem publique relatos em redes sociais sobre suicídio também tome cuidados com o leitor.

O termo "Trigger warning" (aviso de gatilho, em português), por exemplo, tem sido usado na internet, como em blogs feministas, na introdução de textos com relatos de vítimas de estupro.

"A importância desse aviso é prevenir e avisar que os assuntos abordados podem desencadear processos emocionais complexos, dependendo do modo de recepção de quem os assiste ou consome", afirma a professora.

Mostrar ou não?

No Brasil, a taxa de suicídios na população de 15 a 29 anos subiu de 5,1 por 100 mil habitantes em 2002 para 5,6 em 2014 - um aumento de quase 10%, segundo dados do Mapa da Violência 2017. O estudo é publicado anualmente a partir de dados oficiais do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde.

Para Ana Beatriz Silva, como o suicídio normalmente está associado a múltiplos fatores, físicos, sociais e de personalidade, uma cena só será um fator desencadeante caso a pessoa apresente "um quadro de alteração de comportamento, principalmente a depressão."

A psiquiatra disse ter notado um aumento na procura por serviços psicológicos em sua clínica após a "catarse coletiva" motivada pela discussão cultural sobre suicídio. Segundo ela, a maior parte de seus pacientes adolescentes fez questionamentos sobre suicídio motivados pela série da Netflix.

"Eles me perguntavam: 'Qualquer um pode se suicidar?' 'Como uma pessoa se deprime?'. Ou seja, para aqueles que tem contato com uma ajuda psicológica ou que não apresentam uma alteração comportamental, a série foi capaz de despertar uma curiosidade positiva", diz.

https://www.bbc.com/portuguese/geral-39714347

domingo, 10 de junho de 2018

Adamantina-SP se antecipa e já divulga ações do Setembro Amarelo

PAI Nosso Lar e parceiros apresentam programação do Setembro Amarelo

Ações promovem conscientização pela vida e prevenção ao suicídio.

07/06/2018 

Com o desafio de promover ações de valorização da vida, e diante dos índices alarmantes de suicídio na região, o PAI (Polo de Atividades Integradas) Nosso Lar apresentou nesta quarta-feira (6) a programação para o Setembro Amarelo.

A atividade aconteceu no PAI, no final da tarde, reunindo autoridades e representantes de diversos setores da comunidade. A cerimônia foi presidida pela juíza da 3ª Vara da Comarca de Adamantina, Ruth Duarte Menegatti.

Ao antecipar a programação, o PAI Nosso Lar garante tempo hábil para que haja uma ampla mobilização, inclusive regional, em torno do tema. Com isso, as escolas e demais instituições têm condições de promover uma melhor organização e engajamento, e assim ampliar o alcance do Setembro Amarelo.

No lançamento da programação foram apresentados também os parceiros do PAI, na programação Setembro Amarelo: UNIFAI, Santa Casa, Prefeitura de Adamantina, APAE, Poder Judiciário de Adamantina, Ministério Público e Pastorais de Adamantina.

Tema 2018: Esperança

Setembro Amarelo é uma campanha de conscientização sobre a prevenção do suicídio, com o objetivo direto de alertar a população a respeito da realidade do suicídio no Brasil e no mundo e suas formas de prevenção. Ocorre no mês de setembro, desde 2014, por meio de identificação de locais públicos e particulares com a cor amarela e ampla divulgação de informações.
O PAI Nosso Lar está engajado nesse movimento e neste ano, o tema escolhido é a “Esperança”.

Programação

-  1 de setembro – Caminhada da Esperança, 08h30 concentração PAI Nosso Lar com destino final na Praça Elio Micheloni.

- 3 de setembro – Palestra para jovens: “Por que devemos falar sobre o suicídio nos dias atuais”. Palestrante: Drª Michelle Medeiros Lima Salione. Local: Anfiteatro da Biblioteca Municipal de Adamantina. Horário: 19h30.

- 4 a 6 de setembro – Exposição dos desenhos e frases 2º Concurso de Desenho/Frase Infantil – 2018 dos alunos do 1º ao 5º ano das escolas da cidade Adamantina para votação do público. Local: Anfiteatro da Biblioteca Municipal de Adamantina

- 10 de setembro – Gincana da Esperança. Local: PAI Nosso Lar.

- 12 de setembro – Feira de Talentos. Local: Campus II UNIFAI. Horário será divulgado oportunamente.

- 11 a 14 de setembro – Apresentação dos trabalhos 1º Concurso de Criação de História Infanto-Juvenil – 2018 dos alunos do 6º ao 9º das escolas da cidade Adamantina no Sarau da Esperança para votação da comissão julgadora e apreciação do público. Local: Anfiteatro da Biblioteca Municipal de Adamantina.

- 17 de setembro – Palestra para pais e professores: “Suicídio na infância e adolescência”. Palestrante: Drª Michelle Medeiros Lima Salione. Local: Anfiteatro da Biblioteca Municipal de Adamantina. Horário: 19:30h.

- 19 de setembro – Apresentação dos projetos de pesquisa 1ª Feira da Esperança – 2018 dos alunos do Ensino Médio das escolas da cidade Adamantina na Feira da Esperança para votação da comissão julgadora e apreciação do público. Local: Praça Elio Micheloni. Horário será divulgado oportunamente.

- 25 de setembro – Premiação do 2º Concurso de Desenho/Frase Infantil – 2018. Local: PAI Nosso Lar.

- 26 de setembro – Premiação do 1º Concurso de Criação de História Infanto-Juvenil – 2018. Local: PAI Nosso Lar.

- 27 de setembro – Premiação da 1ª Feira da Esperança – 2018. Local: PAI Nosso Lar.

- 29 de setembro – Chá da Esperança. Local e horário serão divulgados oportunamente.

- 30 de setembro – I Festival de Música de Adamantina. Local e horário serão divulgados oportunamente.

- Oficina da Esperança – Local e horário serão divulgados oportunamente.

Fonte: http://www.sigamais.com/noticias/comportamento/pai-nosso-lar-e-parceiros-apresentam-programacao-do-setembro-amarelo/

Adolescência, suicídio e a ausência de sinais...

“Meu filho nunca deu sinal”, afirma pai de adolescente que se matou em Goiânia

Pai de adolescente de 13 anos participou de painel em fórum sobre o tema realizado em Goiânia e relatou como a morte do filho lhe deu força para discutir o assunto

Fabiana Sousa 8/6/2018

Chrystiano Câmara durante painel em que participou: empresário cita o perigo das novas tecnologias, que afastou as pessoas do convívio familiar (Foto: Fábio Lima / O Popular)

O empresário da área atacadista de moda e pai de Gabriel Carrijo Cunha Câmara, Chrystiano Câmara, de 50 anos, esteve presente no I Fórum de Prevenção do Suicídio - Uma Tarefa para Todos, realizado pela Faculdade de Medicina (FM) da Universidade Federal de Goiás (UFG). Durante um dos painéis do evento, Câmara compartilhou com os presentes o luto e as experiências que tem vivido com o suicídio do filho, de 13 anos, que teria pulado da sacada do prédio dos avós, no Setor Marista, no dia 21 de fevereiro deste ano.

O evento, que começou ontem e termina hoje, é destinado a discutir o tema com médicos, estudantes e demais profissionais da área de saúde, além de educadores. A programação é composta por palestras de especialistas na área, oficinas de trabalho, rodas de conversa e depoimentos. Uma das coordenadoras do Fórum, a doutora em psicologia e terapeuta familiar Célia Maria Ferreira da Silva Teixeira explica que um dos objetivos do encontro é conscientizar que não existe um único fator responsável pelo suicídio, e sim, vários. O desafio é preparar as pessoas para lidar com eles. “É preciso que aprendamos a restituir no indivíduo razões para viver”, pontua.

Cristiano, pai de Gabriel, conta que tem recebido com satisfação os convites para conversar sobre o tema e afirma que a morte do filho, agora, é usada por ele para ajudar outras pessoas. “Eu não penso mais no ‘porquê’, senão eu piro. O que eu tenho procurado pensar é no ‘para quê’. E tenho tentado usar a minha dor para que as pessoas discutam o assunto”, explica.

Câmara relata que a morte de Gabriel mexeu completamente com a estrutura da família. “Os especialistas com quem eu já conversei, todo mundo me diz que ele não tinha perfil, que nossa família não tinha perfil. Foi isso que me assustou. Se não tínhamos perfil e aconteceu, o que fizemos de errado?”, questiona. E com isso, tenta passar às pessoas que tem oportunidade que não existe um rótulo nem uma maneira infalível de lidar com o suicídio. “Não pensemos nós que estamos protegidos dentro da nossa caixinha. Não estamos”, alerta. “Meu filho nunca me deu nenhum sinal e pode ter acontecido uma série de coisas que nós não vimos”, desabafa.

Sobre o que teria causado a atitude do garoto, Câmara afirma não buscar mais esse tipo de resposta. “O meu papel de pai eu sei que eu cumpri. Existem esses haters da internet, jogos violentos, cyberbullying, uma série de coisas. Mas quando tudo isso aconteceu eu tive duas escolhas. Ficar tentando entender e entregar a mim e minha família ou reagir”, conta. Cristiano relata que, ao passo que ficou sabendo da morte do filho, se manteve firme para ajudar a família. “Eu apavorei mas não podia me desesperar. Porque senão, ao invés de um, eu perderia quatro”, conta, se referindo à mulher e aos outros dois filhos. “Eu fui levantando um por um. Quando estávamos todos de pé, foi a hora de começar a fazer alguma coisa”, explica.

Dor

Ele admite que a vida não tem sido fácil desde então. “É uma dor que nunca acaba”, desabafa. “Nem eu nem minha mulher estamos cem por cento, mas o que aconteceu com meu filho está sendo motivo para eu ajudar outras pessoas”, conta, emocionado. “Hoje, ao invés de chorar, eu agradeço a ele a oportunidade que estou tendo de falar sobre isso. E, por incrível que pareça, meu filho está mais próximo de mim do que nunca”.

Ele relembra que o garoto de 13 anos nunca apresentou comportamentos depressivos ou qualquer conduta que preocupasse a família. “Meu menino era a criança mais feliz que eu já conheci. Todas as lembranças de felicidade que eu tenho envolvem ele”, conta. Segundo o pai, Gabriel era fã de montaria e estava sempre envolvido com alguma atividade. “Não era uma criança de ficar quieta”.

Durante sua fala, ele advertiu os presentes sobre o perigo da internet na vida de crianças como a de seu filho. “Hoje em dia tem esses grupos aí que se reúnem exclusivamente para causar dor para famílias. É só isso que eles fazem. Para praticar bullying, convencer os meninos a se machucarem. E nós, pais, precisamos ficar atentos a isso”. Além disso, ponderou os pontos negativos que a tecnologia trouxe para o convívio familiar. “Um dia de tecnologia que nós temos equivale a uma vida inteira dos nossos pais, mas isso, que era pra ser bom, tem seu lado ruim também. Depois que inventaram os smartphones, os filhos não conversam mais com os pais, as famílias não se reúnem. Ficou tudo muito distante”, comenta.

Ele fala do amor e do cuidado e afirma serem as únicas coisas que podem mudar os numerosos casos como o de seu filho. “Precisamos fazer uma corrente do bem para cuidar das nossas crianças, dos nossos jovens. Só o amor pode mudar esse mundo”, declara.

E, por fim, declara que o suicídio “está mais próximo do que a gente pensa”. “É preciso preparar professores, médicos, pais, todos. Não podemos ficar de braços cruzados”.

https://www.opopular.com.br/editorias/cidades/meu-filho-nunca-deu-sinal-afirma-pai-de-adolescente-que-se-matou-em-goi%C3%A2nia-1.1547728?usarChave=true



domingo, 3 de junho de 2018

A mulher que usou a tristeza e a saudade para compreender a morte

Michelle Baladão Fagundes transformou a dor imensa da morte de seu irmão em energia para viver mais. Não por mais tempo, mas com mais entrega, mais trocas. Depois da noite trágica de 13 de março de 2017 em que o caçula Marcello tirou a própria vida, a advogada de 28 anos tomou uma decisão: não calar, não sufocar o sofrimento, e sim se abrir, ouvir, compartilhar.

Seis meses depois, estava na rua, literalmente, a Associação Treze de Março, que Michelle idealizou para falar e ouvir quem estava escondido sob o tabu do suicídio. "Onde estavam essas pessoas? Eu queria falar com elas." A primeira ação da organização foi em 20 de setembro de 2017, quando Michelle, com a ajuda de familiares e amigos, colocou uma banca no meio do Parque Moinhos de Vento, em Porto Alegre (RS). Em pleno feriado Farroupilha, distribuíram folders e abordaram os passantes para falar sobre tão delicado tema de maneira "desvinculada da tragédia".

Sob o slogan "Falar é a melhor solução", o Setembro Amarelo é um movimento iniciado no Brasil em 2015 que pretende romper com o tabu em torno do tema. E Michelle quer muito falar: de vida, de saúde mental e, principalmente, de acolhimento.


Segundo a organização Setembro Amarelo, 32 brasileiros tiram a própria vida todos os dias, "uma taxa superior às vítimas da AIDS e da maioria dos tipos de câncer". Na jornada de busca por informação que se seguiu à morte do irmão, Michelle entendeu quão solitária é a experiência de perder alguém para ele mesmo. "No início, eu me sentia extremamente abandonada, mesmo com gente ali do lado. Ninguém consegue entender o que está acontecendo. Me fortaleceu saber que eu não estava sozinha, que não era a única irmã que tinha passado por isso". Descobriu também que muitos sobreviventes (é assim que se chamam os familiares e amigos de quem partiu) até inventam outras causas de morte para não ter de falar em suicídio. "Conheci gente que em 10 anos nunca tinha falado no assunto, gente que diz que o pai morreu de câncer, que a mãe sofreu acidente de carro".

Nesta rede de conexões que se cria entre sobreviventes, a culpa é uma constante, assim como não entender o que aconteceu e por que não se conseguiu evitar a tragédia. "Ninguém salva ninguém. não há como prever o suicídio", afirma Michelle. "Por isso é preciso falar do assunto, com a naturalidade que for possível. Dar ferramentas às pessoas que estão em sofrimento para que elas se salvem." Para Michelle, é muito dolorido ouvir que 90% dos casos de suicídio poderiam ser prevenidos, como preconiza a Organização Mundial da Saúde (OMS). Assim como nem ela nem os pais suspeitaram do que Marcello faria, outras famílias ignoram os sinais. "Ouvir que isso 'poderia ser evitado' alimenta a culpa, a raiva".

Por tudo isso, o foco do trabalho da associação é cuidar de quem ficou. O projeto de Michelle é montar um grupo de apoio aos sobreviventes - para cada suicídio, há em média 50 pessoas impactadas, diz ela. Além de se cercar de pessoas capacitadas, ela mesma estuda o tema (em maio, participou de um curso sobre a posvenção do suicídio e o manejo do luto) - e este ano resolveu atender a um desejo antigo: Michelle voltou à faculdade para estudar psicologia. Mas ela deixa claro que não tem a pretensão de salvar vidas. "Meu trabalho é com base na minha experiência, que é posterior. Se alguém me diz que está preocupado com alguém que pode se matar, sempre mando procurar um psicólogo, psiquiatra, ou ligar para o CVV."

Outro projeto que ela tirou do papel foi trabalhar como voluntária na ONG Doutorzinhos. Desde agosto passado, uma vez por semana ela incorpora a doutora Mi Nhoca, cabeçologista - especialista em minhocas na cabeça. "O palhaço expõe nosso lado mais humano. Ele é ridículo, ri de si mesmo. Ser palhaço é deixar transparecer a tua essência".

Não é à toa que tatuou a palavra "movimento" na perna: além do trabalho como advogada e como palhaça, as atividades da associação e a nova faculdade, Michelle também dança, faz análise e participa de um grupo de escrita criativa. "Eu tinha, e ainda tenho, receio de esquecer as coisas e comecei a escrever com esse foco de escrita-terapia, para me ajudar a entender o que aconteceu". As reflexões registradas em papel vão virar livro.

E ainda tem um casamento para planejar - ela ficou noiva no dia 20 de abril. "Eu pensei muito em como seria fazer isso, celebrar o amor sem o meu irmão. Mas as pessoas vivem na gente. Tem de tocar adiante, respeitando o tempo de cada um, mas sem deixar que isso nos limite para os próximos acontecimentos da vida". Segundo a fundadora, esta é a missão da Associação Treze de Março: viver na plenitude não é ser feliz o tempo inteiro; é ser melhor, apesar dos pesares.

*Caso você — ou alguém que você conheça — precise de ajuda, ligue 188 ou 141 para o CVV - Centro de Valorização da Vida, ou acesse o site. O atendimento é gratuito, sigiloso e não é preciso se identificar. O movimento Conte Comigo oferece informações para lidar com a depressão. No exterior, consulte o site da Associação Internacional para Prevenção do Suicídio para acessar redes de apoio disponíveis.

Fonte: www.huffpostbrasil.com/2018/06/01/michelle-baladao-fagundes-a-mulher-que-usou-a-tristeza-e-a-saudade-para-compreender-a-morte_a_23440196/